*Atualizado em 11/06/2019
Criado em 2008, o Fundo Amazônia promove e apoia financeiramente projetos para a prevenção e o combate ao desmatamento e também, para a conservação e o uso sustentável das florestas na Amazônia Legal, área que compreende nove estados brasileiros e corresponde a quase 60% do território nacional.
O fundo é financiado principalmente pelos governos da Noruega e da Alemanha e seus recursos são geridos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) e os projetos analisados pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA).
Até hoje já foram apoiadas 103 iniciativas e o fundo conta atualmente com R$ 3,4 bilhões em caixa.
Apesar de em nota, a embaixada da Noruega ter declarado estar “satisfeita com a robusta estrutura de governança do Fundo Amazônia e com os resultados obtidos na última década”, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, quer alterar a destinação do dinheiro doado.
No dia 17 de maio, o ministério divulgou que foram avaliados 103 contratos firmados nos últimos dez anos, no valor de R$ 1,5 bilhão, sendo R$ 800 milhões para ONGs. Cerca de 30% deles apresentaram algum grau de inconsistência.
“Precisamos ter mecanismos que possam dar uma melhor destinação e escolher projetos que tenham sentido entre si e que possam ter os resultados mensurados”, afirmou Salles (sim, ele é o ministro condenado por improbidade administrativa pelo Ministério Público de São Paulo (MP-SP), que inclusive já pediu sua saída do cargo).
Uma das medidas realizadas logo após a análise dos projetos do fundo pelo MMA foi o afastamento de sua gestora no BNDES, Daniela Bacas, mesmo embora a Controladoria Geral da União e do Tribunal de Contas da União não ter constatado nenhuma irregularidade no fundo, em 2018. O TCU fez uma auditoria e afirmou que os recursos foram aplicados de maneira adequada.
No dia seguinte ao afastamento de Daniela, indignados, colegas e outros funcionários do banco fizeram um protesto, em frente ao prédio, contra seu desligamento.
Desmatamento, já alto, pode aumentar
Após reunião ontem (27/05), em Brasília, com o ministro da Secretaria de Governo, Santos Cruz, e com os embaixadores da Noruega e da Alemanha, mas sem a presença do presidente do BNDES, Joaquim Levy, Salles declarou que pretende editar um decreto para alterar as normas do Fundo Amazônia, se houver um acordo “entre as partes”.
O ministro quer usar os recursos do fundo para indenizar desapropriações de terra.
Todavia, segundo nota do Observatório do Clima, apenas 3% da área de Unidades de Conservação (UC) no Brasil precisa ser indenizada a proprietários privados.
“Na Amazônia, onde imensa maioria das terras é pública, ocupantes de áreas protegidas frequentemente são grileiros que sabem que não terão direito a indenização. Um exemplo é a Floresta Nacional do Jamanxim, no Pará, em que dois terços dos ocupantes são invasores que chegaram depois da criação da unidade”, contesta o OC. “O plano do ministro é tirar dinheiro das ações que funcionam no Fundo Amazônia e dá-lo a criminosos ambientais. A menos, claro, que a ideia seja regularizar unidades de conservação fora da Amazônia, o que seria um despautério ainda maior”.
O WWF-Brasil também veio a público criticar a possível alteração. “Já existe um fundo de compensação por obras públicas, com R$ 1 bilhão, para ser usado prioritariamente em regularização fundiária. A mudança proposta pelo ministro pode levar a um aumento do desmatamento”, alertou Raul Valle, diretor de políticas públicas da organização, em entrevista à Rede Globo.
Na semana passada, mostramos aqui, que nos últimos quinze dias de maio, a destruição da Floresta Amazônica apresentou o pior índice em uma década: 6.880 hectares, o dobro do que foi registrado no mesmo período em 2018, o equivalente a 7 mil campos de futebol.
Toda essa devastação foi registrada em UCs, que são áreas de florestas protegidas, administradas e fiscalizadas pelo Ibama e pelo ICMBio, os dois órgãos que têm sido enfraquecidos pelo Ministério do Meio Ambiente, sob a gestão de Ricardo Salles.
Os números são do Deter (Sistema de Detecção do Desmatamento na Amazônia Legal em Tempo Real), ferramenta do Inpe – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, que fiscaliza ações de desmatamento, aos quais o jornal Estadão teve acesso.
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*O jornalista André Trigueiro, da Rede Globo, divulgou hoje (11/06) que conseguiu, com exclusividade, cópia de uma carta enviada pelos embaixadores da Noruega e da Alemanha, em que descartam mudanças nas regras do Fundo Amazônia.
Segundo Trigueiro, a carta teria sido enviada na semana passada, no Dia do Meio Ambiente (05/06), para o ministro Ricardo Salles e foram copiados a ministra da Agricultura, Teresa Cristina, o presidente do BNDS, Joaquim Levy, o ministro da Economia, Paulo Guedes, o ministro da Secretaria de Governo, General Santos Cruz, e o embaixador do Itamaraty, Ruy Carlos Pereira.
O texto afirma que “… os dois países afirmam que nunca foram encontrados indícios de irregularidades nas auditorias feitas nos contratos e que governos sozinhos não conseguem reduzir o desmatamento”.
Foto: Neil Palmer/CIAT/Creative Commons/Flickr