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Licenciamento ambiental “flex” sofre derrota na Câmara, mas pode voltar à sessão em 21/12


Por Claudio Angelo e Camila Faria*

União entre governo, oposição e sociedade civil, com o auxílio vital da falta de quórum, impôs uma derrota à bancada ruralista nesta quarta-feira (14/12). Numa sessão tensa, caiu da CFT (Comissão de Finanças e Tributação) da Câmara dos Deputados o substitutivo ao PL 3.729/2004, conhecido como licenciamento ambiental flex. É a segunda vez, em dois meses, que o projeto, patrocinado pelo agronegócio e a indústria, bate na trave na comissão.

O projeto relatado pelo deputado Mauro Pereira (PMDB-RS), membro da Frente Parlamentar da Agropecuária, enfraquece o licenciamento ambiental ao isentar todo o agronegócio e deixar na mão dos Estados a decisão sobre que grau de rigor aplicar a que tipo de empreendimento. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, o texto, se convertido em lei, causaria uma guerra ambiental entre os Estados – que passariam a competir pela atração de empresas quanto mais frouxas fossem suas regras de licenciamento.

Em outubro, os ruralistas tentaram votar o projeto na comissão, mas a tentativa foi barrada por uma ação de última hora do governo e da Frente Parlamentar Ambientalista. Desta vez, segundo o OC apurou, sua inserção na pauta da CFT teve a bênção da própria Casa Civil. O ministério chefiado pelo gaúcho Eliseu Padilha (PMDB), próximo dos ruralistas, coordena dentro do Executivo a negociação de um projeto de Lei Geral do Licenciamento, feito com base numa proposta do Meio Ambiente e que também tem sofrido alterações dentro do governo para ceder a interesses do agronegócio e da indústria.

Pressionada pelos ruralistas, dos quais depende o presidente Michel Temer para avançar as agendas do governo na Câmara, a Casa Civil tentou rifar a proposta do Executivo.

O movimento causou reação do ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho (PV-MA), que já tinha a cabeça a prêmio entre os ruralistas. Na terça-feira, véspera da sessão, Sarney mandou uma carta a Padilha pedindo que o Palácio do Planalto intercedesse para tirar o projeto de pauta. O documento, de 20 páginas, desconstrói ponto a ponto o substitutivo da CFT – que, segundo Sarney, causaria “judicialização do licenciamento no lugar da segurança jurídica”.

Vazada na imprensa ontem, a carta do ministro contribuiu para o clima de final de campeonato instaurado na CFT na manhã de quarta-feira. A sala da comissão lotou, com presença maciça de representantes da Frente Parlamentar da Agropecuária e de ambientalistas.

Logo no começo da sessão, o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ) apresentou requerimento para que o projeto fosse retirado de pauta e para que houvesse verificação de quórum. O presidente interino da comissão, Hildo Rocha (PMDB-MA), concordou.

Seguiram-se intervenções de deputados, com Mauro Pereira e o überruralista Luís Carlos Heinze (PP-RS) protestando contra o pedido. Victor Mendes, do PSB do Pará, disse achar melhor não votar um projeto de tamanha complexidade “aos 48 do segundo tempo”, na última semana de atividade na Câmara. Segundo ele, isso criaria uma exposição desnecessária do presidente Michel Temer e era preciso mais discussão.

Pereira contestou e disse que o projeto foi, sim, discutido. Em seguida, listou todas as organizações que participaram da “discussão” – todas entidades do agronegócio ou da indústria, como Fiesp, CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), Aprosoja, Unica (União da Indústria da Cana-de-Açúcar), CNI (Confederação Nacional da Indústria) e o Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico.

“A sociedade civil ficou de fora da discussão”, disse Edmilson Rodrigues, do PSOL. Ele apresentou a carta da sociedade civil de repúdio ao projeto, com 250 assinaturas, divulgada na segunda-feira.

Diante da oposição dos ruralistas ao requerimento, PT, PSOL e Rede passaram a obstruir a sessão. Por causa das obstruções, Rocha deixou a votação aberta por apenas 15 minutos. Isso não deu tempo a todos os deputados da comissão (a maioria favoráveis ao projeto de Pereira) de aparecer para votar. Ao fim dos 15 minutos, apenas dez dos 22 estavam presentes (sete a favor e três contra o projeto). A sessão foi encerrada, com o compromisso de ser retomada no dia 21 se houver expediente no Plenário da Câmara.

Pereira se levantou gritando com o presidente: “Parabéns, Hildo”! – ironizou.

Procurado pelo OC, o deputado disse que a retirada da pauta demonstra falta de conhecimento e preocupação com o Brasil: “Se continuarmos demorando seis anos para conseguir uma liberação, as empresas no Brasil vão todas embora para o Paraguai”, disse. “Minha expectativa é que o ministro Sarney Filho pense no Brasil e seu desenvolvimento. Espero que haja compreensão disso e que, ano que vem, o projeto seja aprovado”.

“A mobilização em torno do assunto foi fundamental para evitar que isso passasse no apagar das luzes de 2016”, disse Mario Mantovani, diretor de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica. “É prudente que tenhamos um processo voltando ao trilho original, que é o projeto do Executivo. O assunto é muito sério para ficar nesse fla-flu”.

*Este texto foi originalmente publicado no site do Observatório do Clima, em 14/12/2016

Foto: Divulgação/Observatório do Clima (no telão, Mauro Pereira, relator da Comissão que votou o projeto)

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