Lagartixa passa por evolução relâmpago para sobreviver à construção de usina em Goiás

Lagartixa passa por evolução relâmpago para sobreviver à construção de usina em Goiás

Construída há quase 20 anos, a Usina Hidrelétrica de Serra da Mesa está localizada na Bacia do Alto Tocantins, no estado de Goiás. Sua barragem fica bem no curso principal do rio e com a inundação na região, formou-se ali o quinto maior lago do Brasil.

Pesquisadores da Rede de Especialistas de Conservação da Natureza decidiram estudar animais da área para descobrir o impacto que a modificação deste habitat teve sobre as espécies nativas. E descobriram algo surpreendente.

Depois de apenas 15 anos, a lagartixa Gymnodactylus amarali evoluiu para se adaptar à região inundada pela hidrelétrica, que foi fragmentada, provocando a formação de diversas ilhas. Isolados, muitos animais ficaram presos nelas, entre eles, a espécie de lagartixa.

O réptil então desenvolveu uma cabeça maior para comer alimentos maiores. “A lagartixa conseguiu sobreviver ampliando a dieta pela ingestão de cupins maiores, que antes eram alimentos de outras espécies”, explica o biólogo Reuber Brandão, membro da Rede de Especialistas de Conservação da Natureza e professor da Universidade de Brasília.

Cabeça maior para comer presas maiores

Vale ressaltar que para padrões da natureza, 15 anos é pouquíssimo tempo. Como termo de comparação, o ser humano levou 200 anos para ficar 5 centímetros mais alto. Algumas espécies precisam de milhões de anos para apresentar algum tipo de evolução.

A descoberta brasileira, que mostra um caso inédito de evolução rápida de uma espécie, foi relatada em artigo científico na publicação Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America (PNAS).

De acordo com os cientistas, somente as largatixas que vivem nas ilhas desenvolveram cabeças maiores. Os indivíduos da mesma espécie, que permaneceram em terras não inundadas, mantiveram as antigas proporções (morfologia).

Isoladas, lagartixas que ficaram nas ilhas precisaram se adaptar

Infelizmente, nem todos os animais conseguiram se adaptar ao novo habitat. “Nossa pesquisa apurou que muitas espécies foram extintas, seja por isolamento de populações ou por falta de alimento disponíveis”, revela Brandão. O biólogo afirma que metade das espécies de sapos (19) foram extintas em apenas três anos e metade das espécies de lagartixas, cerca de 8, deixaram de existir no local.

O estudo, que teve o apoio da Fundação Boticário de Proteção à Natureza, servirá também para entender quais animais são mais vulneráveis e a dinâmica de extinções em eventos de fragmentação de habitat, com o objetivo de prevenir a extinção de outras espécies. “O lago da Usina Hidrelétrica de Serra da Mesa está sendo um grande laboratório. Queremos criar um modelo que consiga ajudar no manejo de unidades de conservação e assim, preservar a biodiversidade”, diz o biólogo.

Em constante evolução

Um caso semelhante de evolução rápida de lagartixa aconteceu na Flórida, nos Estados Unidos. Em uma década e meia, e aproximadamente, dez gerações, o réptil desenvolveu um novo pé para poder encontrar alimentos mais facilmente no topo das árvores, já que no solo, onde antes vivia, suas presas se tornaram escassas.

Outra mudança foi observada em corujas da Finlândia. Com os efeitos das mudanças climáticas se tornando mais frequentes e extremos, o país tem tido invernos menos rigorosos, com pouca neve. Originalmente, as corujas desta região eram cinzas ou marrons. As de tom cinza, durante o período de frio, conseguiam se esconder melhor de suas presas junto ao branco da neve.

Mas nos últimos 50 anos, com menos gelo, biólogos observaram um declínio nas aves desta cor. Por outro lado, existe um aumento da população das marrons, já que para elas, é mais fácil se esconder em meio às árvores sem folhas.

Fotos: divulgação

5 comentários em “Lagartixa passa por evolução relâmpago para sobreviver à construção de usina em Goiás

  • 31 de agosto de 2017 em 10:34 PM
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    Pode enviar o link do artigo original por favor. Obrigado.

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    • 1 de setembro de 2017 em 7:04 AM
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      Paulo,
      O link original está indicado dentro do texto da matéria.
      Abraço,
      Suzana

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  • 1 de setembro de 2017 em 3:10 PM
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    Boa reportagem Suzana!

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  • 6 de setembro de 2017 em 11:23 AM
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    Cara, lembrando aqui as aulas de biologia, que la se vão um par de décadas, mas lembro de Darwin e seus conceitos, e será, só será, que já não existiam esses dois tipos de lagartixas e somente essa de cabeça maior sobreviveu nessa tal ilha e assim pode ter descendentes também de cabeça grande… né seleção natural.

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    • 18 de setembro de 2017 em 2:22 PM
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      pensei nisso também Gabriel ^^

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Suzana Camargo

Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.