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Harpia, ameaçada de extinção, vive em região de São Paulo que pode ser devastada por termoelétrica


Uma boa e uma péssima notícia, juntas! Na semana passada, o biólogo e ornitólogo Bruno Limaque estuda aves na região de Peruíbe – divulgou, no site Wikiaves, uma gravação importante que fez em 2012, em Itanhaém, e mantinha em segredo até então: o primeiro registro de uma Harpia ou Gavião Real no estado de São Paulo. Ouça agora.

Em seu perfil no Facebook, ele também publicou relato emocionado (e emocionante) desse ‘encontro’, que vale muito ler e, por isso, reproduzo na íntegra, no final deste post. Repare na riqueza de espécies que ele relata. Fiquei encantada ao ler.

Até então, o pesquisador só havia comentado sobre essa descoberta com o atual diretor do Parque Estadual Xixová-Japuí que, na ocasião, trabalhava para a Fundação Florestal e o ajudou a fiscalizar a área. E só guardou esse segredo por tanto tempo porque a ave corre sérios riscos de desaparecer, não só pela destruição das matas, mas também pela caçada indiscriminada já que ela mata galinhas e outros bichos e, por isso, não é bem vista pelos moradores. Soma-se a isso sua reprodução lenta.

No entanto, quando tomou conhecimento de que há planos para a instalação de uma usina termoelétrica em Peruíbeconstrução muito polêmica, contra a qual a sociedade tem se manifestado -, e que suas linhas de transmissão passarão exatamente pelo local onde ele ouviu a Harpia, Lima decidiu falar. Detalhe: nessa área, ainda vivem outras aves ameaçadas de extinção como o Papagaio-de-cara-roxa (Amazona brasiliensis) e o Tauató-pintado (Accipiter poliogaster).

Com essa notícia, o ornitólogo espera, pelo menos, ajudar a impedir que as torres de transmissão da termoelétrica passem pelo local identificado como habitat da Harpia. “Essa espécie necessita de uma área de 50 km quadrados para viver. Matas muito pequenas não servem para ela, pois não encontra alimento, e ainda restam boas matas em Itanhaém, Mongagua e Peruíbe que podem abrigá-la”, explica.

Ele também conta que, certamente, não foi o único a identificar a presença dessa espécie na região: um amigo relatou o voo de um “grande gavião” no alto da serra e o observador de aves Antonio Silveira também comentou sobre dois gaviões que avistou na Estrada de Barreirinho. Mas ambos são relatos sem provas.

Ave majestosa

Sou apaixonada por esta ave de longas asas listradas – em tons de cinza e branco -, que vive em florestas tropicais entre o sul do México e o norte da Argentina, e na Amazônia. Já foi comum na Mata Atlântica, mas foi dizimada pelo ser humano, seu único predador. Por isso, faz sentido o ornitólogo Bruno Lima ter tido tanto cuidado para proteger essa ave majestosa que identificou há cinco anos.

Ela está no topo da cadeia alimentar, por isso é tão imprescindível: come macacos e preguiças, principalmente, mas também répteis e aves menores, cumprindo seu papel nobre de controlar naturalmente a população desses animais, mantendo o equilíbrio da natureza.

Seu nome tem origem na mitologia grega, num ser imaginário com rosto de mulher e corpo de abutre. É também conhecida como Gavião Real por conta da coroa de penas no topo da cabeça e de sua estrutura corporal. É a maior ave de rapina do Brasil: do bico à cauda mede quase um metro e, quando suas asas estão abertas, a distância entre suas pontas pode chegar a dois metros. Os índios a chamam de uiraçu devido a seu grande porte. Não foi à toa que inspirou a Fênix do filme Harry Potter e a Câmara Secreta (foto).

Gigante, poderosa e livre: a descrição emocionante (e emocionada) da descoberta

Era mais uma daquelas trilhas recém-abertas para a demarcação de lotes. Comecei a caminhar ao som de um casal de garrinchões-de-bico-longo que matraqueavam ocultos pela vegetação.

Mosquitos esvoaçavam no ar quente. Ao meu redor, o som de grilos invisíveis se confundia com os chamados da pequena rãzinha-do-folhiço. Ao longe, um pequeno bando de papagaios-de-cara-roxa passava aos gritos. Ao meu lado, um limpa-folha-coroado revirava uma bromélia alheio a minha presença e à fêmea de choquinha-pintada que o observava logo abaixo.

A uns 25 metros acima de minha cabeça uma gralha-azul emitia seus gritos de alarme. Então escutei o chamado característico de um rapinante. Gavião-pato? Gavião-pombo-pequeno? Por aqui há muitas espécies!

Liguei o gravador e segui na direção em que o rapinante havia vocalizado. Cheguei até o local onde a trilha desaparecia em uma região pantanosa repleta de altos guanandis e caixetas. Um bando de guaxes sobrevoava o alto das árvores em direção a seus ninhos colgantes. E lá no alto, entre a densa folhagem de um guanandi encontrei o motivo da inquietação da gralha-azul: a cabeça possante de um enorme rapinante se movia de um lado a outro, metade do corpo oculto pelas duras e brilhantes folhas do guanandi. Não pode ser! Deve ser um jovem gavião-de-penacho! Ela não vai vocalizar de novo?

Um raio de sol penetra o teto de folhas e queima minha nuca. Um tiê-preto emite um pio discreto. Ao longe, um jaó-do-sul lamentou os frutos caídos de cambuci que estavam ali ainda ontem, mas que uma paca os comeu durante a noite. Um galho se rompe e olho para trás (aquela era uma região perigosa, até então). Um caxinguelê percorre os galhos e um macho de rendeira ousa cruzar a trilha com seu ruído característico.

A gralha-azul continua firme em sua função de sentinela da mata de restinga, o topete eriçado, seus gritos enchendo o ar úmido e sem ousar se aproximar muito da árvore da rainha. O gravador continua ligado. Mosquitos engordam rapidamente pousados na minha testa. Então ela vocalizou.

Vibrei ao ver a luz vermelha do meu gravador de mão piscando e gravando. Uma mão trêmula levou o binóculo até meus olhos e me permiti ver os detalhes: o penacho ereto e bipartido, a mancha negra abaixo do pescoço, o bico poderoso. Ela permaneceu pousada e silenciosa mais um tempo até que sua paciência foi vencida pela gralha. Então deixou-se cair, gigante, poderosa e livre, deslizando na direção de um pau-de-balsa.

Me meti no pântano, seguindo por uma espécie de trilha às vezes perdida e às vezes encontrada, mas ao chegar ao pé-de-balsa a rainha já havia partido para algum lugar que até então só ela conhecia”.

Agora, ouça a gravação novamente.

Com informações do site da Editora Livre.

Foto: MCPDigital/Pixabay

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Jose Serrano Agustoni
6 anos atrás

No quinto parágrafo, acho que querias dizer “espécie necessita de uma área de 50 QUILÔmetros quadrados para viver.” (Está escrito 50 metros)

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