PUBLICIDADE

Com um drone, fotógrafo escancara a desigualdade nas grandes cidades pelo mundo

Em 2016, quando chegava à Cidade do Cabo, de avião, o fotógrafo sul-africano Johnny Miller ficou chocado com o que viu: uma cidade dividida que parecia gritar, lá de baixo, as diferenças gigantes nas condições de vida entre ricos e pobres. Estava tudo ali, declarado, sem disfarces. Ele, que estava se mudando para lá para estudar, mal sabia que aquelas sensações o levariam a iniciar uma nova fase em sua trajetória profissional.

Muito tocado pelas imagens aéreas que acabara de ver, Miller observou cada parte do trajeto até a casa onde iria morar, o que evidenciou ainda mais os contrastes sociais. “Do aeroporto até o centro da cidade, passa-se por bairros densamente lotados, cercados por estradas de quatro pistas e altas cercas de arame que agem como barreiras impenetráveis ​​à interação humana”, explicou Miller em seu primeiro artigo para o o jornal britânico The Guardian, nesse ano. “O contraste entre esses municípios e o elegante centro da Cidade do Cabo é chocante – mas, como em todas as cidades do mundo, é fácil para os habitantes viverem todos os dias ignorando as disparidades. Talvez seja, também, um mecanismo de defesa: a quantidade de ajuda que esta cidade precisa para se consertar pode parecer esmagadora”.

E não demorou muito para criar o projeto que o tornaria conhecido pelo mundo, Unequal Scenes (Cenas Desiguais). Com ele, o fotógrafo, jornalista e antropólogo apresenta a realidade escancarada pela arquitetura e pela infraestrutura das grandes cidades com imagens – videos e fotos – feitas nas alturas por um drone.

No segundo artigo que escreveu para o The Guardian, no ano passado, ele comentou a escolha desse equipamento: “É surpreendente como olhar para algo de um novo ângulo pode mudar as perspectivas das pessoas. Quando iniciei o projeto, não fazia ideia de que pilotar um drone sobre os distritos, condomínios fechados e campos de golfe da África do Sul poderia causar tal impacto. Até mesmo o ângulo dessas imagens parece importante. As pessoas me dizem que as cenas de cima (a “visão mais baixa”), sem horizonte algum, são as mais impactantes. Talvez seja o contraste elevado, ou talvez seja o sentimento de distanciamento do outro mundo que essa visão oferece”.

Vi algumas imagens com outro ângulo e realmente não têm o mesmo impacto das capturadas de cima. Mas veja as fotos de Mumbai que selecionei: uma está no destaque deste post e outra abaixo. A que foi feita de cima, impressiona pela geometria, mas a outra é muito impactante também. A foto na Cidade do México, em outro ângulo ainda, é mais um ótimo exemplo (veja mais adiante).

No mesmo ano, Miller se dedicou a registrar as desigualdades da cidade que o acolheu – onde mora – e o provocou a “denunciar” tamanha injustiça com seu talento (veja a imagem feita em Durban, com seu campo de golfe Papwa Sewgolum (foto abaixo).

Em seguida, partiu para outras cidades da África do Sul. Ainda no continente africano, desbravou Nairobi, no Quênia (foto, abaixo), e a Tanzânia (segunda foto, abaixo). Só depois é que partiu para metrópoles reconhecidamente desiguais em outras regiões, como Mumbai, na Índia (destaque deste post) e a Cidade do México, no México (terceira foto, abaixo).

Ele esteve no Brasil em julho do ano passado, mas não chegou a revelar as cidades que escolheu para sobrevoar com o drone. E, por enquanto, nada do que ele fez por aqui foi publicado em seu site.

Também foi aos Estados Unidos, onde se demorou e contou com o apoio financeiro de duas organizações: International Center for Journalists e Code For Africa. Passou pelo sul da Califórnia – em São Francisco, Los Angeles e Oakland -, e seguiu para Baltimore, Detroit, Richmond e Seatle. E a seleção de imagens já está em seu site.

Sobre a Califórnia, ele escreveu na página do projeto no Facebook: “Este é um estado que representa o excepcionalismo sobre o qual os americanos aprendem desde cedo – que esse lugar é diferente de qualquer outro; talvez divinamente ordenado, mas certamente abençoado. Mas, o sul desse estado é também um grande produtor de petróleo, e as instalações de armazenamento e refinarias são companheiros desconfortáveis ​​para os bairros da classe trabalhadora”.

Drones: impulso para a narrativa nas linhas de frente da África

Mas suas incursões ativistas com o drone não se resumem ao projeto Unequal Scenes. Johnny Miller também é fundador da ONG AfricanDRONE, uma organização sem fins lucrativos que apoia “a evolução de um ecossistema vibrante e diversificado de drones em todos os países da África”.

Seu objetivo é capacitar pessoas interessadas em atuar com drones, por meio de uma rede que oferece financiamento inicial, desenvolvimento de habilidades, compartilhamento de recursos (de tudo, desde drones até servidores de computação de dados) e de conhecimento, defesa de direitos e oportunidades de trabalho.

“Acreditamos que os drones – em terra, no ar e sob o mar – proporcionam aos cidadãos novas formas poderosas de entender melhor seu mundo e melhorar a responsabilidade pública”. Assim pensam Miller e seus companheiros nesse projeto, Christian Onyando e Fred Mbuya.

Para eles, os drones “podem turbinar a storytelling (narrativa) das linhas de frente na África” porque vão onde os humanos não podem, oferecendo aos jornalistas, por exemplo, acesso mais barato e seguro às zonas de conflito e outras áreas perigosas, como é o caso de desastres naturais.

A mais perfeita tradução visual da desigualdade no Brasil

Será que Johnny Miller conhece a imagem que o fotojornalista Tuca Vieira fez, em 2004, da favela de Paraisópolis no abastado bairro do Morumbi, na cidade de São Paulo? Ela foi publicada no jornal Folha de S.Paulo e é inesquecível.

De helicóptero (naquela época drone ainda era sonho), Tuca registrou os barracos da favela em contraste com sua vizinhança ostentatória: um prédio de luxo, que exibia uma piscina por andar, além de uma piscina grande e uma quadra de esportes de uso comum dos moradores.

A imagem se espalhou pelo mundo em notícias sobre a foto (no jornal britânico The Guardian, por exemplo) ou ilustrando o mesmo tema e, com o advento das redes sociais, navega por posts variados até hoje, transformando-se na mais perfeita tradução visual da desigualdade no país.

Tuca fala dela em seu site, onde comenta sua utilização sem critério e sem crédito. Outro dia, encontrei-a num post no Facebook, servindo de fundo para um “meme” sobre violência e concentração de renda (abaixo). Sem qualquer menção ao autor. Quem a utiliza não deve saber quem a fez, nem se importar com isso. O que importa é o impacto que ela causa. E causa, mesmo. E crédito e reconhecimento são importantes. Vamos respeitar, né? E acompanhe Tuca pelo Facebook (mural aberto) e Instagram. Ele tem um olhar especial para as cidades.

Outro mestre das imagens aéreas, no cinema

Vale lembrar, aqui também, de outro mestre das imagens aéreas, que também revela o mundo por esse ângulo, mesmo antes do advento do drone, e as divulga em outra plataforma: o cinema. É Yann Arthus Bertrand, criador de vários projetos importantes – entre eles, Six Billion Others ou Seis Bilhões de Outros, que foi exibido em 2009 no Masp, em Sao Paulo -, sendo o último deles o maravilhoso Human.

Os três filmes de Human (com 1 hora e meia cada) que compõem esse trabalho estão disponíveis no You Tube: Volume 1, Volume 2 e Volume 3. Vale assistir a esta obra-prima completa. E acompanhar sua página no Facebook.

Então, depois do vídeo publicado pelo The Guardian, com algumas das imagens capturadas pelo drone de Johnny Miller para seu projeto Unequal Scenes, assista o trailler da versão reduzida de Human para o cinema, exibido no Brasil no ano passado:

Fotos: Johnny Miller

Comentários
guest

1 Comentário
Oldest
Newest Most Voted
Inline Feedbacks
View all comments
Valdir Ferrazde Oliveira
Valdir Ferrazde Oliveira
5 anos atrás

Desigualdade social – Drones na África
Em 2010, pude observar na Cidade do Cabo e Durban essa gritante desigualdade social em duas importantes cidades da Áfricado Sul.
Fiquei horrorizado, ver imensas favelas a beira das rodovias cinstruidas de restos de placas metálicas que torna a temperatura ambiente extremamente ruim no verão e no inverno.
Vi, tambem dezenas de jovens negros desemptegados e em frente aos ricos condomínios residenciais esperando por trabalho manual nesses condomínios.

Enquanto isso, o centro urbano dessas cidades espelham uma outra realidade, modernicidade, grandes corporações lá instaladas. Muito triste e preocupante

Notícias Relacionadas
Sobre o autor
PUBLICIDADE
Receba notícias por e-mail

Digite seu endereço eletrônico abaixo para receber notificações das novas publicações do Conexão Planeta.

  • PUBLICIDADE

    Mais lidas

    PUBLICIDADE