Eunice Terres precisou dar pontos

Eunice Terres precisou dar pontos

Não digo assim que é um bordado. É mais a costura de um machucado o que a curitibana Eunice Terres faz. Pontos precisos que, querem  remendar crateras de queimadas, quem sabe. Era tudo, há tão pouco tempo tecido verde, malha para receber e produzir chuva… Agora um deserto arquitetado pelas quadrilhas de desmatamento. Organizações que trocam garantia de futuro respirável por atividades retrógradas e criminosas.  Como se criar gado e cultivar monocultura a perder de vista fosse método lastreado pelos melhores dos projetos ambientais. Vem, esse pessoal, com números da fome, alardeiam a necessidade de produção de comida em larga escala. Agrofloresta fazem que nunca ouviram falar.

Caminhos para diminuir os problemas da fome global “devem ser a promoção e o desenvolvimento da agricultura sustentável, com ênfase nos pequenos agricultores dos países em desenvolvimento”. É informação do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU, que fala de soluções de médio e curto prazo.

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Esses fios que conduzem para um caminho de segurança alimentar, continua o documento da ONU, “precisam ser conseguidos por meio da tecnologia verde para reduzir o uso de fertilizantes e pesticidas, e tornar mais eficiente o uso da energia, da água e dos recursos naturais”. Mãos a obra. Nada de dar ponto sem nó. Vamos pintar e bordar nessa luta afora pela liberdade de consumir e viver melhor.

Em pequenos bordados, do tamanho de uma moeda de 1 real, Eunice Terres reproduz  ideais e conceitos de liberdade em várias áreas.

Agulha e linha não só bordam. Formam ideias, rostos e expressam atitudes. Bordar, diz ela, é expressão do feminino. Empodera e fortalece. Traça rumos, faz e conta histórias.

“Em cada período da história em que os extremos reacionários se movimentaram para manter a ordem da dominação, o feminino esteve presente em processo transformador. Inquestionável, transgressor, único e resoluto, nas lutas cotidianas e na arte”, escreve Eunice no texto que abre a sua pequena exposição Entrelaços que pode ocupar qualquer cantinho.

A exposição, explica, “pretende reatar fios constantemente (e violentamente) cortados.  Num processo de conexão das feminilidades de outros tempos, passados e futuros. Em meio de conexões cibernéticas e redes mundiais, sociais e aproximações ideológicas em um clique, o bordar retoma o antigo, o vínculo entre a mão, a agulha e o fio, que imprimem marcas eternas na tessitura da vida e da história humana.”

Eunice separou trechos sobre cada personagem que bordou. Falam delas, falam dela. Falam de todos nós. Uma agulhada certeira.

Reproduzo alguns deles aqui:

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Querer ser livre é também querer livres os outros.
Simone de Beauvoir

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“(E o que mais dói) é viver num corpo que é um sepulcro que nos aprisiona (segundo Platão) do mesmo modo como a concha aprisiona a ostra.”

“Pés, para que os quero, se tenho asas para voar?”
Frida Kahlo

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Frida em bordado, Frida em boneca que tem cara de dor muda. E faz o maior sucesso. Eunice já avisou que não quer ficar só fazendo Fridas por aí, embora haja muitos pedidos. Essas coisas de artista de verdade. Essa gente que está sempre à procura de uma nova ideia, de uma outra inspiração e que não tem meio de  sossegar…

Princesa africana bordado, vidrilhos, miçangas, pintura.
Princesa africana bordado, vidrilhos, miçangas, pintura. Por Eunice Terres

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Karen Monteiro

Com arte, tá tudo bem. Se as exposições, peças de teatro, shows, filmes, livros servirem de gancho para falar de questões sociais e ambientais, tanto melhor. Jornalista, tradutora, cronista e assessora de imprensa, já colaborou com reportagens para grandes jornais, revistas e TVs.