Um jeito diferente de produzir e de estar no mundo, que também move o PIB

Quinze de dezembro é celebrado como o dia nacional da economia solidária. E apesar de todo o quadro político e econômico do país e seus reflexos nessa economia, ela segue com bastante fôlego. Ela é, justamente, uma alternativa a essa crise.

Desde abril deste ano, busco trazer para este espaço as diversas formas de associação que compõem a economia solidária, seus diferentes arranjos e possibilidades. Apresentei empreendimentos, redes, empresas e as histórias das pessoas envolvidas.

Os atores que fazem a economia solidária são mesmo variados e, neste último post de 2016, apresento uma instituição que já apareceu perifericamente em alguns posts por aqui, embora eu não tenha falado especificamente sobre ela.

Trata-se da Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários do Brasil, conhecida como Unisol Brasil. Uma associação civil com fins não econômicos, de abrangência nacional, comprometida com a defesa dos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras, a melhoria de suas condições de vida e trabalho, a eficiência econômica e a defesa e participação no processo de transformação da sociedade brasileira pelos valores da democracia e da justiça social.

Seu surgimento está atrelado ao das cooperativas no Brasil, em especial a partir da década de 1990, e com a busca por alternativas de geração de trabalho e renda diante da crise que o Brasil vivia na época. Várias entidades de apoio às cooperativas foram constituídas e, como consequência, em 2003 surgiu, no âmbito do Ministério de Trabalho e Emprego, a Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES).

A Unisol Cooperativas foi fundada em 2000, a partir da atuação de cooperativas criadas com apoio do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e de Sorocaba e do Sindicato dos Químicos do ABC, contando com o apoio de outras instituições e inicialmente restrita ao estado de São Paulo. No mesmo ano, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) lançou a Agência de Desenvolvimento Solidário (ADS), buscando organizar e fomentar o desenvolvimento local pelo país.

As duas entidades decidiram pela constituição de uma central de empreendimentos solidários e cooperativas de alcance nacional, para levar adiante o projeto de inclusão econômica e social, de participação no capital e nos ganhos gerados pelo trabalho. Surgia assim a Unisol Brasil.

Hoje presente em todos os estados nacionais, a Central contempla cerca de mil empreendimentos, entre filiados e atendidos por projetos, em dez setoriais de atuação: metalurgia/polímeros, alimentação, construção civil/habitação, confecção e têxtil, cooperativas sociais, reciclagem, artesanato, agricultura familiar, apicultura e fruticultura.

“No momento atual pelo qual passa o país, de crise econômica e política, os atores da economia solidária e do cooperativismo podem se afirmar, reforçar seu posicionamento a respeito da necessidade de o Brasil construir um outro modelo de desenvolvimento, que seja pautado na eficiência econômica, mas também na eficiência social e, principalmente, na sustentabilidade ambiental. Nesse sentido, a Unisol Brasil tem trabalhado, por exemplo, quando da falência de empresas, em pautar fortemente o assunto das fábricas recuperadas“, afirma o presidente da Unisol Brasil, Leo Pinho (falei um pouco sobre isso, aqui no blog).

E continua: “Temos também promovido um grande processo de diálogo para reforçar os empreendimentos e as cooperativas da agricultura familiar, para que a produção alimentar brasileira consiga ser mantida, ampliando as compras públicas, garantindo mais renda e mais trabalho no campo brasileiro”, afirma o presidente da Unisol Brasil, Leo Pinho.

Outras frentes de atuação incluem a formação de um conjunto de redes, como forma de organizar os empreendedores individuais em coletivos, impulsionando cooperativas e associações que promovem inclusão produtiva. O trabalho visa o fortalecimento e a organização do cooperativismo e da economia solidária como alternativa para manter postos de trabalho, gerar novas oportunidades e renda para toda a população, e em especial para os setores mais vulneráveis da sociedade.

Boa fatia do PIB

Segundo o Atlas Digital dos dados do Sistema de Informações em Economia Solidária, da SENAES, o último mapeamento nacional de empreendimentos econômicos solidários no Brasil, finalizado em 2013, registra 19.708 empreendimentos e seria responsável pela movimentação de 1% do PIB brasileiro. No entanto, estima-se que esse número seja muito maior. Segundo o presidente da Unisol Brasil, seria da ordem de 7% a 8%.

“Se considerarmos como economia solidária apenas os empreendimentos que se identificam com o conceito de empreendimento econômico solidário, estamos falando por volta de 1% do PIB nacional. É o que nos dizem os últimos dados, um pouco defasados, que o Ministério do Trabalho tinha construído, por meio da SENAES. Mas quando a gente associa também todos os segmentos do cooperativismo, percebemos que esse setor da economia brasileira é muito dinâmico, e hoje chega mesmo a 7% ou 8% do PIB. A Unisol Brasil trabalha com essas duas frentes, e tem inclusive como foco organizativo o movimento cooperativista”, aponta Leo Pinho.

Com a reunião das organizações do cooperativismo brasileiro na União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias (UNICOPAS) – incluindo a Unisol Brasil, a Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil (CONCRAB), a União Nacional das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária (UNICAFES) e a recente incorporação da  União Nacional dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis do Brasil (Unicatadores) –, a presença da economia solidária no PIB brasileiro tende a tornar-se cada vez mais forte.

“A abrangência hoje da economia solidária e do cooperativismo do ponto de vista do PIB vai mesmo de 7 a 8%. E tem também uma outra abrangência, que eu acho muito importante: a economia solidária tem se afirmado como uma alternativa de autonomia e de promoção de cidadania para as políticas universais de direitos, como o Sistema Único de Saúde e o Sistema Único de Assistência Social. Ela tem se mostrado uma saída eficaz para a superação do ciclo de vulnerabilidade que essas populações têm encontrado”, avalia Leo Pinho.

Novo modelo

A Economia Solidária é um jeito diferente de estar no mundo e de produzir. Não existe patrão nem empregado, pois todas as pessoas que integram o empreendimento (associação, cooperativa ou grupo produtivo) são ao mesmo tempo trabalhadores e donos.

É o consumo de produtos locais, saudáveis, que não afetam o meio ambiente. Significa ainda mudar o paradigma da competição para o da cooperação e inteligência coletiva, partilhada.

E é também um movimento social que luta pela mudança na sociedade, por uma forma diferente de desenvolvimento, que seja baseada nas pessoas, construída pela população a partir dos valores da solidariedade, da democracia, da cooperação, da preservação ambiental e dos direitos humanos.

É por isso que me empenho em trazer aqui, a cada semana, peças desse quebra cabeça complexo, mas fundamental no mundo de hoje.

Foto: Adina Voicu/Pixabay

2 comentários em “Um jeito diferente de produzir e de estar no mundo, que também move o PIB

    • 21 de dezembro de 2016 em 5:50 PM
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      Olá, Ivanilde. Veja no site da Unisol como funciona o trabalho – unisol.org.br

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Mônica Ribeiro

Jornalista e mestre em Antropologia. Atua nas áreas de meio ambiente, investimento social privado, governos locais, políticas públicas, economia solidária e negócios de impacto, linkando projetos e pessoas na comunicação para potencializar modos mais sustentáveis e diversos de estar no mundo.