Do que as crianças precisam?

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Se nos pusermos a investigar a essência de uma criança com cuidado e delicadeza, descobriremos a potência de toda a humanidade. A cada nascimento, temos a possibilidade de dar continuidade ao mundo, deixando-o um lugar mais bonito e afável. Para isso, porém, precisamos reconhecer cada criança como um ser único, que carrega consigo a possibilidade de ser tudo aquilo o que desejar. Como adultos, devemos dar condições para que essa potência seja alcançada. Mas como fazer isso?

Antes de chegar à família ou a determinado grupo social, a criança chega ao mundo. Ela já nasce detentora de direitos inalienáveis, previstos tanto por organizações globais, como a ONU, como também pela constituição de cada país; no caso da nossa é a Constituição Federal de 1988, em específico, o artigo 227.

Nele, a criança é vista como prioridade absoluta e deve ter acesso à saúde, educação, cultura, lazer e à vida familiar e comunitária. Todos estes são espaços que contribuem para seu desenvolvimento integral e saudável e devem ser garantidos não somente pelo Estado, ou pela família, mas por todos os que participam da sociedade, incluindo a escola.

Como espaço educativo, a escola deve ser capaz de olhar a criança de forma integral, compreendendo-a como sujeito múltiplo e complexo, que está além de aspectos meramente cognitivos. Além disso, deve atentar-se à importância das experiências subjetivas e sociais na construção da história de vida de cada criança.

Além de aprender matemática e português, crianças têm direito a experimentar diferentes linguagens e formas de expressão, conhecer e circular por diferentes territórios, entrar em contato com as belezas – e também com as dores – do mundo.

Será, porém, que as nossas escolas olham para a integralidade da criança e oferecem experiências capazes de empoderá-las frente ao mundo?

Se muitas escolas ainda se fecham a essa abordagem, outras já caminham rumo ao que chamamos Educação Integral, uma concepção de educação que foca no desenvolvimento das múltiplas dimensões humanas.

Nessa concepção, que não se limita a quantidade de tempo passada na escola, outros espaços passam a ser reconhecidos como educativos, isso por que são valorizados os diversos saberes e fazeres vindos dos territórios além-muros da escola, e diferentes sujeitos e tempos são compreendidos como fundamentais para o processo ensino-aprendizagem.

No Brasil, segundo dados do Inep, 12,5% das crianças do ensino fundamental público estão matriculadas em programas como o Mais Educação, estratégia do Ministério da Educação para induzir a ampliação da jornada escolar e a organização curricular na perspectiva da Educação Integral. Contudo, vale frisar que dados do mesmo relatório indicam aulas de português e matemática como as mais expressivas do Programa por número de matrículas, o que revela o desafio de romper muros e reconhecer os territórios como elementos da educação das crianças.

O que vale mais? Alguém lhe falar sobre o perfume da flor ou você senti-lo? O que ficará em sua memória? E, para senti-lo, é preciso ir ao campo, colher a flor, olhar para ela. Trata-se de uma experiência.

Tal lógica pode ser aplicada a qualquer tipo de conhecimento. Apreendemos melhor quando participamos ativamente de determinada situação. Por isso é tão importante que as escolas – e as famílias – se abram para os territórios que as cercam.

O adulto deve conduzir a criança, de forma sutil, às riquezas do mundo. Vivenciar o território também contribui para a construção de um referencial mais largo e o despertar de novas sensações, como a sensação de pertencimento comunitário, que favorece o desenvolvimento das noções de cuidado e de preservação do planeta.

Se garantirmos às nossas crianças o direito à vida comunitária, incentivando-as a circularem por praças, museus, parques, e pelas ruas e avenidas da cidade, teremos grandes chances de despertar nelas o sentimento de responsabilidade e interesse pelo mundo – e pelo conhecimento!

Algumas escolas brasileiras já estão fazendo isso. São escolas que valorizam a vida comunitária, integrando-a a práticas educativas. No site do programa Escolas Transformadoras é possível conhecer um pouco mais dessas histórias.

Outra referência interessante são as pesquisas desenvolvidas pelo Território do Brincar, iniciativa que olha para o que acontece fora da escola e registra momentos de puro encantamento da criança com seu entorno, numa relação de completo envolvimento com a diversidade proporcionada pela vida em comunidade.

Crianças precisam experimentar a vida, os saberes populares, as culturais locais. Não podemos bani-las do mundo, caso contrário, elas jamais saberão que são parte de um todo, que, em última instância, chama-se humanidade.

Foto: zoetnet/Flickr

6 comentários em “Do que as crianças precisam?

  • 28 de janeiro de 2016 em 10:09 PM
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    Logo no comecinho de uma palestra o Prof. Pierluigi Piazzi fala que prefere que não o chamem de “‘educador’, porque os pais vão querer logo ‘terceirizar'”. Educação individual seria função da família, do lar; seria aquele conhecimento primordial e profundo que a criança teria antes de mais nada consigo própria, que a habilitaria a interagir melhor com o seu universo espacial e social, quando as crianças poderiam, efetivamente, “experimentar a vida, os saberes populares, as culturas locais”, uma História local que lhe diga respeito, que a represente, que construa sua auto estima, fazendo-a sentir-se satisfeita em ser o que é.

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Carolina Prestes

Comunicóloga, Mestra em Ciências da Comunicação e especialista em Infância, Educação e Desenvolvimento Social. Trabalha há mais de 12 anos com pesquisa e produção de conteúdo sobre temas diversos, principalmente nas áreas da infância, da educação e da cultura. É editora do Blog ‘Além dos Muros da Escola”, canal de reflexão sobre práticas de educação não formal, e fundadora da Letras&Linhas, empresa cujo foco é entregar textos que encantam, mobilizam e transformam. Mãe da Olivia e da Pilar