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Correndo sobre rios invisíveis

circuito-rios-e-ruas-abre-800x445A Corrida Rios e Ruas tem trajeto desenhado sobre rios e ribeirões que foram asfaltados, mas que sobrevivem abaixo do concreto de São Paulo, e propõe resgate da relação da cidade com suas águas.

Arremesso meu corpo para frente com passadas rápidas durante o declive da Alameda do Lago, lar do macaco-aranha-de-cara-preta, no Zoológico de São Paulo. Corro o Circuito Caixa Rios e Ruas 2015,  que traça provas de corridas por onde existem ribeirões e rios esquecidos e escondidos – ou nem tanto – da cidade de São Paulo.

O circuito tem três provas e decido participar das duas primeiras, em 23/8 e 25/10. Estou fora de forma. Talvez mais ainda do que os rios invisíveis sob meus pés as nascentes do Rio Ipiranga. A cada quilômetro percorrido, impossível não pensar que abaixo de toda essa distância ­– asfaltada, claro – há um trecho de um rio tão famoso e histórico. Asfixiado, soterrado, sujo, semimorto. Mas ainda vivo, ainda recuperável, ainda rio.

Avanço pela primeira etapa, que parte do Zoológico de São Paulo e termina no Jardim Botânico. Os macacos gritam e saúdam a multidão de corredores enquanto seguimos para a Alameda do Leão. Entre o sobe e desce das ruas do zoo, elefantes, girafas, rinocerontes, araras e tucanos nos espiam, curiosos com o movimento.

Como seria a cidade se os 300 rios e ribeirões – hoje invisíveis – estivessem livres? E limpos? E por eles nadassem pessoas, peixes, anfíbios e animais? Como seria viver entre rios e ribeirões, preservados, cuidados, integrados ao asfalto, ao concreto, às vigas tortas e aos postes de luz? Aqui, entre as árvores centenárias do Jardim Botânico, fica fácil imaginar, poetizar. A natureza inspira e prometo a mim mesmo treinar mais para melhorar minha performance na etapa do Centro, em outubro.

Depois de dois meses, parto firme para a segunda etapa, mas a verdade é que não consegui treinar nenhum dia. As ruas do Centro velho da cidade recebem um mar de corredores verdes – a corrida passa pelos pontos mais tradicionais desse entorno, como a Praça da Sé, o Pátio do Colégio, a Praça da República, o Mosteiro São Bento e o Teatro Municipal. Seguimos o trajeto do Ribeirão do Itororó, que vai formar o Ribeirão do Anhangabaú.

Depois de metade da prova começo a ter dores nos pés e a sentir bolhas. Diminuo o ritmo para poder chegar ao final. Cruzo o Viaduto do Chá e sigo em trote pelas ruas de comércio mais movimentadas da cidade, como Rua Direita e Rua Quinze de Novembro. Me sinto mais poluído do que antes, assim como os rios da cidade, que o poder público insiste em tratar como esgoto.

Difícil admitir que somos parte de uma civilização que insiste em se alimentar mal, em trabalhar demais, em consumir sem pensar, em desviar recursos alheios, em agredir o diferente, em matar o mais fraco, em maltratar mais ainda nosso tão soterrado meio-ambiente.

Cuidar dos rios e ruas da cidade é uma proposta crucial. Junto a ela cabe, mais do que nunca, o resgate da conexão do nosso espírito, da nossa mente e das nossas emoções, não só com a natureza, mas com nossa própria essência, muitas vezes invisível também em nosso dia a dia.

Atravesso a linha de chegada mancando, sou quase um dos últimos. Com a medalha em mãos, decido retomar os treinos – e com eles muito mais do que cuidar da minha forma, mas sim da minha morada, do meu lugar no mundo.

Na próxima etapa do circuito – a 3ª. e última, no Parque Ecológico do Tietê, em 29/11 – não poderei participar. Mas estou firme e forte nos treinos três vezes por semana com um grupo de corredores. No ano que vem, estarei bem preparado. Os macacos, elefantes e girafas que me esperem.

Fotos: Divulgação/Rios e Ruas

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