Contra o sol, a calvície e o Mal de Parkinson, própolis vermelha

Dalbergia ecastophyllum_AnitaStival_FloraDigital_BLOG

Devemos às abelhas uma boa lista de produtos medicinais e cosméticos à base de própolis, já disponíveis no mercado ou ainda em fase de pesquisa. Mas as abelhas também devem à flora nativa uma parte do crédito pelos princípios ativos dos diferentes tipos de própolis.

Bem diferente do mel, a própolis é composta de uma mistura de resinas, óleos essenciais e óleos aromáticos, coletados em diferentes plantas, mais cera e outras secreções das abelhas. É usada como selante antimicrobiano, nas frestas e nos espaços vazios da colmeia, com o objetivo de proteger as abelhas, suas larvas e seu alimento contra bactérias e outros agentes nocivos.

Existe uma classificação das própolis, por cores e locais de origem, sendo que a própolis vermelha do litoral brasileiro – explorada, em especial, na região Nordeste – tem características associadas à resina (também vermelha) de uma planta cujo nome científico é Dalbergia ecastophyllum. Trata-se de uma moita ou subarbusto, de cerca de 60 centímetros de altura, que ocorre em solos arenosos alagáveis e com alta salinidade, muitas vezes formando concentrações perto de mangues. Os nomes comuns são bem variados e até curiosos: rabo-de-bugio, marmelo-do-mangue, moeda-de-videira, feijão-de-guaiamum, verônica-branca, arco-de-barril.

A resina vermelha é exsudada quando a planta é atacada por brocas. E, então, as abelhas aproveitam para coletar a matéria prima, a ser usada na fabricação do selante de colmeias.

Para os pesquisadores, as propriedades da própolis vermelha são múltiplas – cicatrizante, antioxidante, antitumoral, entre elas – e muito interessantes. Um grupo de cientistas japoneses da Universidade de Hokkaido, por exemplo, divulgou o potencial do extrato alcoólico contra a calvície, em um artigo no Journal of Agricultural and Food Chemistry. Shota Myata, Yozo Oda, Chika Matsuo, Haruto Kumura e Ken Kobayashi depilaram o dorso de camundongos, tendo observado o crescimento mais rápido dos pelos no grupo tratado com a “própolis brasileira”, em relação ao grupo controle.

Em Sergipe, a doutora em Fisiologia, Margarete Zanardo Gomes, do Instituto de Tecnologia e Pesquisa (ITP), avalia o extrato hidroalcoolico da própolis vermelha como uma nova estratégia terapêutica no tratamento do Mal de Parkinson, doença progressiva do sistema neurológico. Cerca de 3% das pessoas com idade superior a 40 anos sofrem desse mal, conhecido por afetar a coordenação motora, causar tremores e dificuldades para caminhar. O estudo é financiado pela Fundação de Apoio à Pesquisa e Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe (Fapitec-SE) e, desde 2011, rende diversas teses de mestrado e doutorado.

O produto da própolis vermelha mais próximo do mercado, no entanto, parece ser o protetor solar. Outra equipe de pesquisadores do ITP sergipano trabalha, desde 2013, no desenvolvimento de filtros contra os raios ultravioleta do sol (UVA e UVB). Originalmente, a pesquisa pretendia verificar a ação do selante em casos de queimaduras por excesso de exposição ao sol, mas as atividades anti-inflamatória e antioxidante da própolis vermelha revelaram potencial também na prevenção das queimaduras, ou seja, como protetor solar.

O pedido de patente já foi depositado no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) e a pesquisa já entrou em fase de testes clínicos (isto é, com pessoas). O foco, no momento, é identificar o Fator de Proteção Solar (FPS), indicativo do tempo de proteção. Depois ainda serão pesquisados a estabilidade do produto e o prazo de validade.

A equipe de pesquisa é liderada pelos professores doutores Juliana Cordeiro Cardoso e Ricardo Luiz Cavalcanti de Albuquerque Júnior, ambos docentes do Programa de Pós-Graduação em Saúde e Ambiente da Universidade Tiradentes (Unit) e da Rede Nordeste de Biotecnologia (Renorbio). Ainda fazem parte da equipe as alunas de mestrado, Ângela Alves, e de doutorado, Cinthia Meireles.

Quem sabe nos próximos verões já teremos a opção de um protetor solar mais natural e (ao menos parcialmente) nativo, graças a uma pesquisa genuinamente nacional. Ficamos na torcida!

Foto: Anita Stival/Flora Digital (ramo de Dalbergia ecastophyllum com flores e favas verdes)

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Liana John

Jornalista ambiental há mais de 30 anos, escreve sobre clima, ecossistemas, fauna e flora, recursos naturais e sustentabilidade para os principais jornais e revistas do país. Já recebeu diversos prêmios, entre eles, o Embrapa de Reportagem 2015 e o Reportagem sobre a Mata Atlântica 2013, ambos por matérias publicadas na National Geographic Brasil.