A conexão essencial com as árvores

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Sempre que você encontrar (reparar em) uma árvore, é importante ter consciência de que está em contato com uma das estruturas mais elaboradas, essenciais e completas da natureza. Uma árvore não é um ser isolado: é uma rede de interações, trocas, doações e conexões.

Se, com nosso olhar, tivéssemos a capacidade de enxergar todas essas redes de contato estabelecidas entre árvores e outros seres, elementos e processos, elas certamente não passariam despercebidas. Pelo contrário, acredito que não haveria ser humano capaz de ameaçar a existência e a segurança das árvores.

Desde a primavera de 2006, quando idealizei o Instituto Árvores Vivasisso ficou muito claro para mim. Cada árvore é um ser conectado com tudo à sua volta, garantindo qualidade de desenvolvimento para inúmeros seres e sistemas, configurando-se em suporte imprescindível para a vida neste planeta. Percebi que estas conexões vão além dos aspectos biológicos e ecossistêmicos. Enxerguei a árvore como um ser a partir do qual podemos relacionar todas as áreas de estudo e do conhecimento, seja sobre aspectos da história dos povos, seus mitos e culturas, seja na elaboração de cálculos e soluções nas mais avançadas pesquisas tecnológicas ou de engenharia. Para mim, árvores são plenas e repletas de sabedorias que podemos aprender a receber.

Esse olhar tecnológico tem sido traduzido e desvendado por pesquisadores e cientistas. A equipe do projeto Árvore Ser Tecnológico, por exemplo, tem feito um lindo trabalho de tradução desses conceitos para o público, a partir das pesquisas do cientista Antonio Donato Nobre.

Incrível imaginar a capacidade de bombeamento de água de uma árvore do porte de uma sequoia, ou as estratégias reprodutivas e de crescimento que seguem padrões e dão respostas afinadíssimas com o ambiente onde vivem.

Impressionante ainda a capacidade de comunicação entre plantas que tem sido desvendada, seja por partículas de odor espalhadas pelos ventos, seja por uma extensa rede de conexões no subsolo composta por suas raízes e auxiliada pelas estruturas vegetativas dos fungos. Estas conexões podem comunicar perigo e ameaças de plantas próximas, além de distribuir nutrientes entre elas.

São tantas as vidas conectadas às árvores e às florestas! São tantas as maneiras como estas conexões são estabelecidas! Como podemos não sentir, não valorizar, não agradecer e não lutar pela sua preservação? Será que estamos tão cegos assim? Fechados e limitados? Esse estado é um desejo humano? Como podemos construir essas barreiras de conhecimento, percepção e sentimento em nossas vidas?

Esse tipo de conexão consciente precisa ser resgatada e restabelecida. Por isso, tenho me dedicado há tantos anos à promoção e ao desenvolvimento da cultura ambiental na sociedade e, principalmente, entre as crianças. É imprescindível compreender que a natureza está totalmente conectada a nós e nós a ela. Essa percepção precisa acontecer dentro do coração e não ser uma reação diante das crises que estamos vivendo. Precisamos enraizar a semente de que somos natureza em nosso ser.

As redes sociais, como conhecemos e usamos hoje, são reproduções dessas conexões. Somos interdependentes e toda instabilidade dessas conexões nos afeta. Proponho, então, um exercício para todos os dias, uma prática simples a ser adotada em poucas etapas:

– Escolha e conecte-se com a árvore que mora mais perto de você;
– Crie um pequeno diário sobre esta árvore com anotações simples e diretas das suas observações;
– Você pode fazer esse exercício sozinho ou com sua família e amigos: antes de começar, respire fundo algumas vezes, sempre de olhos fechados para poder abri-los e ver algo novo;
– Mantenha a mente aberta e sem limites, não julgue suas observações;
– Faça suas observações por etapas ou setores, por exemplo: árvore inteira, casca, galhos, folhas, raízes, flores, frutos, sementes;
– Marque sempre o dia e o horário de sua observação;
– Não se preocupe em usar nomes científicos ou “precisos” de tudo que observar e, se preferir, desenhe;
– Anote informações sobre cores, desenhos, temperatura, umidade, sons, formas, outras plantas e animais vistos na árvore, além de qualquer aspecto ou situação que chame sua atenção;
– Deixe sua observação conduzir você: deixe-se levar por sentimentos, valores, percepção de movimento, continuidade, estruturas;
– O ideal é fazer uma observação por dia e focar. Evite fazer uma lista enorme de tudo que você percebe em suas observações. São tantas as possibilidades e em tantas escalas – árvore inteira ou um micro detalhe – que não há como observar tudo de uma só vez. Imprima um ritmo às suas observações: uma por dia é ideal e ajudará você a estabelecer uma conexão também com o tempo da natureza;
– Procure fazer essa conexão e observações de maneira analógica, isto é, sem celular, sem foto. Aproveite o momento da conexão e da observação, que pode acontecer em qualquer lugar, a qualquer momento, mas sem a interferência de nenhum tipo de instrumento além da sua existência e da própria árvore.

Essas dicas de exercício de conexão poderão revelar muitas novas percepções. Você pode notar, inclusive, que, ao passar dos dias, você comece a notar mais da vida à sua volta e dentro de você do que antes. É possível que comece a “brotar” a semente de conexão com a sua natureza essencial. Quem sabe essa experiência ajude a despertar soluções, respostas e percepções inovadoras em sua vida.

Observar a árvore do seu caminho com mais profundidade e atenção poderá se revelar a porta para um mundo interior bastante significativo. Que tal praticar, todos os dias, essa conexão atenta com as mestras árvores e toda a natureza?

Fotos: Pixabay – Huskyherz  e Unsplash 

7 comentários em “A conexão essencial com as árvores

    • 10 de novembro de 2015 em 2:37 PM
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      Olá Mariana, fico feliz em saber que apreciou o texto. Que você, eu e todos possam sempre ser inspirados pela natureza!

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  • 10 de novembro de 2015 em 12:23 PM
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    Exercício maravilhoso Jú, proposta aceita, reconectar com a natureza é o caminho para a paz.

    um grande abraço!

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    • 10 de novembro de 2015 em 2:35 PM
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      Olá Eliete, fico feliz em saber que irá colocar em prática o exercício, tenho certeza que irá lhe fazer muito bem, assim como faz a mim! Abraço carinhoso

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  • 10 de novembro de 2015 em 11:45 PM
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    Texto lindíssimo que mexeu muito com minhas emoções. Moro, atualmente, em uma cidade onde vão ser sacrificadas cerca de trezentas árvores por conta de um BRT que não soluciona a questão de transporte da cidade e que provocará um crime ambiental sem precedentes.. Dezenas de árvores têm mais de sessenta anos, em sua totalidade formam um canteiro central nas duas principais Avenidas da cidade! Estamos lutando contra essa devastação e contra essa ruptura da rede de conexão que você citou nesse belíssimo texto!

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    • 16 de novembro de 2015 em 8:08 PM
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      Olá Regina,

      fico muito feliz em saber de está lutando pela vida de tantas árvores. A visão de ampliar vias em detrimento à vida é realmente assustadora. Vivi algo similar de perto em 2009 na ocasião da obra de ampliação da marginal tietê aqui em São Paulo, aumentar as faixas na marginal não mudou em nada o volume de trânsito no local, e muitas vidas de diversas espécies de árvores foram sacrificadas. Mesmo com um grande grupo lutando por elas, a obra foi realizada. E até hoje obras como essas continuam tratando vida de árvores como se nada fossem, em diversos pontos daqui de São Paulo, imagino que de todo o Brasil. Por favor, compartilhe mais sobre a luta de vocês em nossa página do Facebook. Assim mais pessoas podem multiplicar e apoiar essa luta.

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  • 2 de março de 2023 em 6:36 PM
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    Meu sítio estava morrendo. Se desfazendo aos poucos. Fiz um exercício e vi uma árvore. Lembrei que quando comprei havia uma árvore grande e nenhuma construção. Com o tempo a paisagem foi ficando comum.
    Mas hj depois do exercício me dirigi a ela e percebi nela um ancião e me abri para sua sabeforia.
    Que paz e alegria eu senti.
    Seu texto me ajudou muito.
    Gratidão profunda.

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Juliana Gatti

Mestranda na área de Conservação da Biodiversidade e Desenvolvimento Sustentável, sua pesquisa dedica-se a avaliar a influência da natureza na qualidade de vida de crianças e sociedade. Idealizou o Instituto Árvores Vivas em 2006, onde promove ações de conexão com a natureza por meio de apreciação, restauração e fomento da cultura ambiental.