Como falar de proteção e conservação da natureza com as crianças, de um jeito apaixonante?

O óleo que se espalha pela costa brasileira chama a nossa atenção não só pela tragédia, mas pela mobilização que provoca nas pessoas. Há tempos que, para além de iniciativas do governo – que andam escassas -, são as pessoas e as organizações não-governamentais (ONGs) que têm se dedicado a agir para proteção e conservação da natureza.

Do outro lado do oceano, em Portugal, mais precisamente na região de Cascais, a bióloga marinha Ana Pego, moradora local, num belo dia, começou a recolher o lixo que encontrava na praia. Em suas caminhadas diárias pelo litoral, a quantidade de plástico chamou sua atenção. E, para compartilhar essa percepção com as pessoas que também vivem por ali, Ana criou uma página no Facebook – Plasticus maritmus -, dando ao lixo plástico a conotação que ele merece: uma espécie invasora.

Foi devido a esse canal criado por Ana que os objetos encontrados nas praias da região tornaram-se visíveis pra muita gente. Parece até que um nome que parece científico ajuda no alerta sobre qualquer assunto, mais rapidamente. Neste caso, chamou a atenção para a forma como estamos tratando esses resíduos e descartando-os na natureza, tornando-os parte da paisagem ao ponto de não nos incomodar.  Lamentamos, mas nos acostumamos com eles.

A quantidade encontrada em algumas regiões é absurda. Por vezes causam espanto por terem vindo de tão longe (identificável pelo rótulo) ou, ainda, de tempos antigos (anos 60, 70…). As imagens publicadas por Ana nessa página ilustram bem como o plástico tem se tornado de fato uma espécie invasora em nossas vidas, em nossas rotinas.

A bióloga organiza os objetos que encontra e os classifica, como fazem os cientistas. E, assim, seus registros são bastante curiosos, além de extrapolarem o plástico: uma quantidade infinita de canudinhos e tampas de garrafa pet (é claro!), mas também botões, pedras de bingo, balões, bonecos, escovas de dente, objetos religiosos, plantas artificiais.

A variedade é imensa e nos traz importantes reflexões, não apenas sobre para onde vai o que chamamos de lixo, como também sobre o modelo de vida que escolhemos e como os plásticos fazem parte dessa insustentabilidade.

O petróleo, que dá origem ao plástico, e que se formou a partir da transformação de imensa quantidade de plantas ao longo de milhares de anos, parece ser preferência mundial na sociedade dita moderna. Do jeito que se proliferam, dominarão cada vez mais os espaços de matérias vivas como plantas e animais.

Hoje, além da página no Facebook, Plasticus martimus tem perfil no Instagram (desde setembro de 2018; abaixo o primeiro post), já realizou uma exposição educativa – Plasticus maritimus, uma espécie invasora, no Museu da Água de Coimbra, em agosto e setembro deste ano – e lançou livro, publicado há um ano pela editora portuguesa Planeta Tangerina, que está na terceira edição. 

E é aqui que começa outra história. Afinal, este blog trata da relação das crianças e natureza e muita gente quer saber como falar desses temas tão difíceis – meio ambiente, mudanças climáticas, lixo – de um jeito que impacte, mas também apaixone as crianças.

Parece que nossa amiga Carla Otta encontrou uma forma bacana. Ela leu o livro de Ana Pego com seus filhos e compartilhou com a gente as percepções das crianças a respeito de tudo que ouviram e descobriram.

“Elas levantaram muitos questionamentos e conflitos sobre as escolhas que fazemos todos os dias”, conta. E continua: “Meu filho de seis anos, por exemplo, tem refletido muito sobre seus brinquedos e já me perguntou: ‘Os brinquedos são todos de plástico! Como a gente faz pra mudar isso?‘. Ele ainda repensou as brincadeiras com bexigas – que ele ama nas festas -, o quanto são nocivas para o meio ambiente. Tem sido muito importante vê-lo resistir à vontade de brincar e de ter balões por um motivo maior. O livro ainda validou a importância de mudar nossos hábitos e sempre carregar copos (e canudos, se for o caso) duráveis conosco, onde quer que vamos, para evitar consumir os de plástico”.

Não é incomum nos perguntarem como se pode trabalhar temas relacionados à sustentabilidade ambiental com as crianças. Escrevemos sobre o assunto para este blog, em maio de 2018. Repensar a maneira como temos vivido e as escolhas que temos feito é um bom caminho para iniciar esse diálogo.

Passeios por parques e jardins junto com as crianças, pode ser uma boa oportunidade para isso também. Proponha que prestem atenção aos materiais encontrados pelo chão e os coletem, como faz Ana Pego. Esta pode ser uma forma prática e bem próxima de refletir sobre tema tão grave e urgente em nossa realidade cotidiana. 

É importante lembrar que, dedicar tempo e atenção aos aspectos ruins de nossa realidade, não deve conduzir as crianças a um desapontamento em relação ao mundo em que vivem. A intenção não é deixá-los tristes, apenas apresenta-los à realidade que pode ser transformada por todos.

E claro que, tais iniciativas, podem e devem ser acompanhadas de brincadeiras com a natureza, que oferecem infinitas possibilidades de encantamento e poesia, aspectos essenciais e próprios do universo infantil. Seja qual for o assunto, mesmo que seja tão terrível como a destruição da natureza e do planeta devido ao consumo excessivo.

Nada melhor do que conhecer para transformar e proteger. Se isso for feito de maneira inteligente e perspicaz com as crianças, mais eficaz será o resultado. E eles representam o presente e o futuro.

A seguir, posts da Ana Pego em seu Instagram, que mostram pedaços de plástico encontrados nas praias das Avencas, em março do ano passado, um post sobre o livro e outro sobre a exposição:

Fotos: Reprodução Instagram/Plasticus Maritimus

Deixe uma resposta

Ana Carolina Thomé e Rita Mendonça

Ana Carolina é pedagoga, especialista em psicomotricidade e educação lúdica, e trabalha com primeira infância. Rita é bióloga e socióloga, ministra cursos, vivências e palestras para aproximar crianças e adultos da natureza. Quando se conheceram, em 2014, criaram o projeto "Ser Criança é Natural" para desenvolver atividades com o público. Neste blog, mostram como transformar a convivência com os pequenos em momentos inesquecíveis.