Cientistas pedem proibição de agrotóxico que compromete saúde mental de crianças e aumenta risco de autismo


Cientistas pedem proibição de agrotóxico que compromete saúde mental de crianças e aumenta risco de autismo em fetos

“Temos evidências claras de dezenas de estudos em seres humanos de que a exposição de mulheres grávidas a níveis muito baixos de pesticidas organofosforados colocam crianças e fetos em risco de problemas de desenvolvimento que podem durar a vida inteira”, denuncia Irva Hertz-Picciotto, pesquisadora do UC Davis Environmental Health Sciences Centre e autora principal de um artigo que acaba de ser divulgado na publicação científica Plos Medicine.

“É hora de proibir não apenas o clorpirifós, mas todos os organofosforados”, ressalta a cientista.

A classe de pesticidas chamada de organofosforado (organophosphate – OP – , em inglês) foi desenvolvida nas décadas de 1930 e 1940, originalmente como um agente de gás nervoso humano, mas depois adaptado, em doses menores, para ser utilizado como inseticida.

O novo estudo revela é que o uso indiscrimado deste tipo de agrotóxico compromete a saúde mental de crianças do mundo inteiro, sobretudo, em países em desenvolvimento. Testes comprovam que a exposição a essa substância química, mesmo em doses baixas, acarreta em redução de QI e de memória e pode aumentar os riscos do déficit de atenção, assim como, aquele de ocorrência de autismo.

E não é só. Em doses mais altas, os pesquisadores afirmam que os organofosforados podem levar à morte.

O grupo de cientistas americano é enfático em salientar a necessidade da proibição urgente desses agrotóxicos.

Só na Europa, estima-se que mais de 10 mil toneladas de organofosforados sejam empregados na lavoura por ano e um volume ainda maior nos Estados Unidos. Todavia, muitos desses produtos já foram banidos nesses lugares, entre eles, o terbufó, o qual foi associado com o aparecimento de leucemia, câncer de pulmão e linfoma de non-Hodgkin. No continente europeu, os principais fabricantes de organofosforados são Bayer-Monsanto, Syngenta e DuPont.

Em seu site, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), responsável pelo controle e liberação de agrotóxicos no Brasil, afirma que apenas os organofosforados com ingredientes ativos F15 – Forato, M10 – Metamidofós e T21 – Triclorfom não têm seu uso permitido no país.

Veneno no prato e no ar

Em julho deste ano, noticiamos aqui, no Conexão Planeta, a publicação de um relatório, feito pela Human Rights Watch que denunciava as falhas para proteger as populações de comunidades rurais brasileiras expostas à dispersão de pesticidas.

De julho de 2017 a abril de 2018, a organização entrevistou 73 pessoas afetadas pela utilização de agrotóxicos em sete zonas rurais, nas cinco regiões do Brasil, incluindo comunidades indígenas e quilombolas e escolas rurais.

Segundo o relatório, em todos estes lugares os entrevistados descreveram sintomas relacionados com a intoxicação aguda por agrotóxicos após verem pulverização dos mesmos nas proximidades ou sentirem o cheiro deles recentemente aplicados em plantações próximas. Os sintomas incluíram sudorese, frequência cardíaca elevada e vômitos, além de náusea, dor de cabeça e tontura.

O Brasil é um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo. Por ano, o setor comercializa algo em torno de US$ 10 bilhões. Em 2014, a estimativa era de que cerca de 7,5 quilos de pesticidas foram usados, por pessoa, no país. Entre as dez substâncias mais utilizadas por aqui, quatro são proibidas na Europa.

Se já não fosse o suficiente, há um projeto de lei tramitando em Brasília, o chamada #PLdoVeneno, que quer facilitar ainda mais o registro dos agrotóxicos. A sociedade civil está mobilizada para tentar barrar este absurdo, mas no final de junho, os integrantes da Comissão Especial que julga o PL 6299/2002 se reuniram a portas fechadas e aprovaram o texto, que será agora discutido no plenário.

De acordo com as Nações Unidas, 200 mil pessoas morrem anualmente devido à intoxicação por agrotóxicos – 99% dos casos acontecem em países pobres.

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Foto: domínio público/pixabay

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Suzana Camargo

Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.