Cervejaria artesanal apoia projetos de preservação de animais em risco de extinção

Quando Alessandro Pisa, Beatriz Oliveira, Danielle Mingatos, Flavio Garcia e Jorge Yoloshyn – todos apreciadores de cerveja e envolvidos com ela, de alguma maneira – decidiram criar uma marca, já tinham algumas diretrizes bem definidas que norteariam a trajetória da Cia. de Brassagem Brasil, CBB, lançada em maio do ano passado.

A primeira diz respeito ao tipo de bebida: CBB é cerveja artesanal, ou seja, natural, sem aditivos químicos, respeita o processo sem interferências. “Uma das características desse tipo de produção é o acompanhamento do cervejeiro – o nosso é Luiz Pisa – do início ao fim do processo: da moagem do grão, passando pela mostruação, filtragem, fervura, fermentação, carbonatação até o envase da cerveja”, explica Beatriz, diretora de marketing e parcerias. “Nenhum aditivo químico é inserido pra acelerar o processo. É uma produção que respeita o tempo e os movimentos da cerveja. Tudo é 100% natural: água, malte, lúpulos, levedura”.

“Ciganar” a produção é outra parte importante da estratégia da CBB. Significa que eles não construíram uma fábrica para produzir suas cervejas, mas usam a ociosidade de fábricas já instaladas. “Alugamos espaços em pontos diversificados para produzir nossas receitas”, ressalta. Muito sustentável, em vários aspectos.

E o terceiro ponto imprescindível do projeto: promover sentimento de brasilidade. “A ideia era fortalecer o que o Brasil tem de melhor, com cara de Brasil, promovendo suas potencialidades, o que inclui a consolidação de sua escola cervejeira, na qual acreditamos e trabalhamos por essa cfenca”, conta Beatriz. “É uma das maiores do mundo”, acrescenta. “E nada melhor do que ainda usar nossos produtos para falar de uma temática bem brasileira como nossa biodiversidade, que também é uma das mais ricas do planeta”.

Foi assim que surgiu a ideia de estampar espécies de animais nos rótulos das cervejas, com um detalhe: todos em risco de extinção. “Esta é uma das bebidas alcoólicas mais consumidas no mundo, então, porque não usa-la para ajudar a conscientizar as pessoas sobre os problemas ambientais que acontecem no país?”.

Mas os cinco amigos quiseram ir além: não queriam só apresentar algumas espécies para seu público, mas indicar projetos de conservação que trabalham para ajudar a tirá-las do risco de extinção. E apoia-los com parte da renda de cada produto.

Assim, estampam as latas e as garrafas de cerveja a tartaruga-de-pente (Projeto Tamar), o mico-leão-dourado (Associação Mico Leão Dourado), a ariranha (Instituto para a Conservação dos Carnívoros Neotropicais, mais conhecido como Pró-Carnívoros), a onça pintada (Onçafari, no Pantanal), o tamanduá-bandeira (Projeto Tamanduá Brasil) e a arara-azul-de-lear (Fundação Biodiversitasque mantém a Estação Biológica de Canudos, reserva dedicada à conservação da espécie, no sertão baiano). Uma das aves mais ameaçadas do mundo, esta última espécie foi escolhida para rotular a cerveja lançada em maio para celebrar a abertura do primeiro bar da CBB, no bairro do Campo Belo.

Vale ressaltar que esse trabalho de conscientização não se restringe à divulgação desses projetos em seu site ou nas redes sociais, mas também de temas da atualidade, como a epidemia de febre amarela, que levou muitos macacos bugios à morte, não só pela doença, mas pela ignorância da população. E também quando o último rinoceronte branco morreu na África. A marca usa sua página no Facebook para falar de temas tão delicados e necessários. Muito legal!

E, assim, em pouquíssimo tempo, a CBB conquistou um super reconhecimento por sua atuação diferenciada. Com apenas 87 dias de existência, recebeu prêmio de uma das maiores feiras técnicas da America Latina (Brasil Baru), como o melhor programa de Responsabilidade Social entre as cervejarias brasileiras.

Uma cerveja para cada causa

Hoje, com pouco mais de um ano, a cervejaria paulistana produz três mil litros de cada um dos estilos de cerveja que comercializa em dez estados pelo Brasil. Abaixo, estão os bichos que habitam cardápio da cervejaria. E também a que foi criada em parceria com outra cervejaria , que apoia projetos relacionados a pessoas com câncer. A História é muito tocante.

A onça pintada é é o maior maior felino das Américas e o terceiro do mundo e, na CBB, dá nome a uma cerveja Session IPA (India Pale Ale), feita com lúpulo Sorachi Ace, que lhe confere propriedades cítricas, e os sabores marcantes de frutas amarelas como abacaxi, maracujá e manga.

Apoia o projeto Onçafari, que atua no Pantanal, promovendo a conservação do meio ambiente e o desenvolvimento socioeconômico local por meio do ecoturismo e de estudos científicos.

Vienna Lager, “leve, com equilíbrio elegante de maltes e lúpulos” é o tipo de cerveja escolhido pela CBB para receber no rótulo o elegante tamanduá-bandeira, que vive no Cerrado.

A organização que recebe apoio financeiro com sua venda é o Instituto de Pesquisa e Conservação de Tamanduás no Brasil, mais conhecido como Projeto Tamanduá Brasil. A instituição atua desde 2005 desenvolvendo ações de pesquisa, educação e promoção de políticas públicas para a conservação de cerca de 30 espécies de tamanduás, tatus e bichos-preguiça.

O Mico Leão Dourado. é a espécie que acompanha a cerveja tipo Irish Red Ale, “ligeiramente malvada, com sua suave dulçor de caramelo”.

Parte de sua venda é destinada para a Associação Mico Leão Dourado, organização de caráter científico social e educacional com a missão de promover a conservação da Mata Atlântica (situada na baixada costeira do Rio de Janeiro) e sua fauna característica, principalmente a espécie de macaco que lhe dá nome.

A tartaruga de pente está no rótulo de uma Belgian Blond Ale, intensa e ao mesmo tempo refrescante, com notas de caramelo e agradável presença cítrica, reforçada pela utilização de coentro, de forma bem sutil.

Quem pede esta cerveja, apoia o Projeto Tamar, reconhecido internacionalmente como uma das mais bem sucedidas experiências de conservação marinha. Ele é modelo para outros países, sobretudo por envolver comunidades costeiras em seu trabalho socioambiental. Sua missão é realizar pesquisas, a conservação e o manejo das cinco espécies de tartarugas marinhas brasileiras, todas ameaçadas de extinção: uma delas é a que aparece no rótulo da cerveja.

Os números dizem tudo sobre a abrangência desse conhecido projeto: protege cerca de 1.100km de praias, em 25 áreas de alimentação, desova, crescimento e descanso desses animais, no litoral e ilhas oceânicas, em nove estados brasileiros.

A ariranha estampa a garrafa de uma cerveja complexa e intensa: a Tropical Stout, com sabores e aromas tostados, com notas de café e chocolate, dulçor suave e cremoso, além de notas sutis de amburana (árvore típica do nordeste).

A organização beneficiada com a venda desta cerveja é o Instituto para a Conservação dos Carnívoros Neotropicais, mais conhecida como Pró-Carnívoros que desenvolve pesquisas científicas, protege áreas prioritárias, realiza treinamentos e capacitações de profissionais em manejo e conservação de predadores naturais, educação ambiental, produz material educativo e apoia políticas públicas.

A última cerveja incluída no cardápio – “uma bebida refrescante, “tipo Weissbier”, com “notas de banana e toques sutis de fenólico que remetem a cravo e especiarias” – leva o nome de uma das aves mais ameaçadas de extinção no mundo: a linda arara-azul-de-Lear, endêmica da Caatinga baiana, região do Raso da Catarina, sertão, onde vivem cerca de 1.350 indivíduos. A foto é de João Marcos Rosa (um dos fotógrafos que assinam o blog Por Trás das Câmeras, aqui no Conexão Planeta), que lançou livro sobre essa arara em parceria com Gustavo Nolasco.

A arara-azul-de-Lear recebe os cuidados especiais da Fundação Biodiversitasque mantém a Estação Biológica de Canudos, reserva dedicada à conservação da espécie, e onde desenvolve turismo de observação, atraindo amantes de aves do mundo inteiro. Realiza trabalho lindo de mapeamento do comportamento das araras, realizando censos e monitoramento, protegendo os locais de dormitório e reprodução, realizando atividades de educação ambiental não formal e cursos de capacitação.

Mas não são só animais que são homenageados pelas cervejas da CBB. A Here Comes The Beerfoi idealizada pelos donos da CBB e da cervejaria Crazy Rocker (Léo Bregula), durante um evento no qual se conheceram. Mas o projeto colaborativo ficou engavetado por quase um ano porque Léo foi diagnosticado com câncer na amígdala. Ele ficou afastado do trabalho durante nove meses.

Após o tratamento intenso e de ser confirmada a cura da doença, a ideia foi retomada pelos amigos, agora com um detalhe: a cerveja seria vendida com o intuito de arrecadar 100% recursos financeiros para apoiar pessoas em tratamento de câncer na região da cabeça e do pescoço. A intenção era comprar aparelhos de laserterapia – que ajudam a reduzir os efeitos da radioterapia – para institutos e hospitais que não têm acesso a esse tipo de equipamento. E tudo foi realizado exatamente assim.

Essa cerveja é uma Session Amber Ale com aroma e sabor que equilibra maltes e lúpulos, lembrando frutas doces e cítricas,  ainda com características florais.

Quem disse que não dá pra realizar (e juntar) sonhos, ganhar dinheiro, reduzir a pegada do seu negócio, se realizar profissionalmente e ainda espalhar conhecimento sobre grandes desafios da atualidade? Sem ser chato e ainda aproveitando momentos de lazer e prazer.

Fotos: Divulgação

Deixe uma resposta

Mônica Nunes

Jornalista com experiência em revistas e internet, escreveu sobre moda, luxo, saúde, educação financeira e sustentabilidade. Trabalhou durante 14 anos na Editora Abril. Foi editora na revista Claudia, no site feminino Paralela, e colaborou com Você S.A. e Capricho. Por oito anos, dirigiu o premiado site Planeta Sustentável, da mesma editora, considerado pela United Nations Foundation como o maior portal no tema. Integrou a Rede de Mulheres Líderes em Sustentabilidade e, em 2015, participou da conferência TEDxSãoPaulo.