Brumadinho Invisível: o movimento SP Invisível está na cidade mineira para dar voz às vítimas do crime da Vale

Desde 2014, o movimento SP Invisível conta histórias de pessoas que vivem nas ruas, aquelas que passam despercebidas por nós todos os dias. Ou pior: que, muitas vezes, não queremos perceber porque estamos com pressa, porque não sabemos o que fazer, porque nos sentimos impotentes diante de sua realidade. Mas não só de histórias vive esse movimento. O grupo também promove ações com o intuito de ajudar a humanizar os olhares de todos que vivem na capital paulista, para que ela se torne mais humana.

Esta semana, SP Invisível foi para Brumadinho, em Minas Gerais. Assim que seus integrantes souberam da tragédia, em 25 de janeiro (dia em que celebravam o aniversario de São Paulo), decidiram rumar para lá para dar voz a seus moradores, a todos que perderam casas, filhos, mães, pais, parentes, amigos e que viram a região virar um lamaçal tóxico por irresponsabilidade e ganância de uma empresa (veja no final deste post, os links de todos os textos que publicamos sobre o assunto até agora). Pessoas que podem parecer invisíveis para a mineradora Vale, mas não são, e estão tendo a oportunidade de contar sobre suas dores, suas perdas. E também os bravos e incansáveis bombeiros e seus mascotes, que estão fazendo o resgate de vítimas.

Esta ação ganhou o nome de Brumadinho Invisível, que virou hashtag (#BrumadinhoInvisível) dentro do perfil no Instagram e de sua página no Facebook. Mas eles não queriam apenas fazer registros comoventes. Queriam ajudar essas pessoas efetivamente, por isso, criaram uma campanha de arrecadação no site de financiamento coletivo Catarse, que tem apenas mais seis dias para acabar. Sua meta é juntar 30 mil reais. Dei uma olhada agora e apenas R$ 4.245 foram arrecadados. Vamos participar? De qualquer forma, como a campanha é flexível, qualquer montante reunido será doado para para ajudar a criar um fundo para a reconstrução da cidade.

Em suas redes sociais, até agora, eles publicaram os relatos de oito pessoas.

Tragédia anunciada
As histórias do seu Onofre Agostinho da Silva (na foto de destaque deste post), que perdeu um sobrinho querido, do seu Francisco que falou com muita tristeza das mortes dos sobrinhos e de um vizinho bacana, e de Leidiane, que trabalhava numa pousada e não tem mais esperança de encontrar a mãe com vida, são as mais comoventes.

Mas, hoje, eles publicaram uma denúncia grave, de Wilson José Ferreira, que disse ter previsto a tragédia em 2016, mas ninguém quis ouvir.

“Três anos atrás eu já previa esse acidente. Trabalhei na área em 2001 e 2002, naquela época já constava muita umidade nas barragens, a estrutura era muito ruim. Aí quando aconteceu o desastre em Mariana, me entrevistaram pra uma TV e eu falei que ia cair essa de Brumadinho. Meu nome é Wilson José Ferreira. Essa barragem aqui era a mais perigosa. Sempre falei que se ela rompesse, ia tudo embora, sempre bati nessa tecla, mas ninguém me dava atenção, só porque eu não tinha conhecimento técnico, não era engenheiro, não era formado”.

E continuou vociferando: “Só que o que eu falei veio acontecer. Agora, não dá para descrever a tristeza. Acabou o nosso sossego, perdemos muitos queridos. Fica a indignação com a Vale que riu de mim várias vezes através dos engenheiros e com o prefeito. Com esse, eu nem quero papo.

Eu me arrependo de não ter ido afundo no meu aviso, podia ter salvo a vida de várias pessoas. Só que sem apoio, sem escuta, sem alguém te incentivando fica difícil. Agora tamo tudo arrasado”.

Veja, abaixo, o post que ainda reproduz o vídeo (em duas partes) da reportagem da Rede Minas à qual Wilson se refere:

Uma pena que somente homens engravatados e estudados sejam ouvidos. Aqui, a sabedoria simples e exata de Wilson foi ignorada. Não combinava com os interesses escusos da Vale.

Mas tem morador, como o Geraldo, que, apesar do crime desta empresa, ainda acha que a empresa deve continuar atuando em Brumadinho porque a cidade depende 65% dela. Ele trabalhou por 26 anos na Vale e só não estava no escritório (que foi o primeiro a ser arrastado pela lama) porque se recupera de uma cirurgia.

Também tem um moço bastante pessimista sobre o desaparecimento das pessoas: “Infelizmente, eu acho que já foi todo mundo que está desaparecido e tem corpo que nem vai achar. E o pessoal quer ganhar dinheiro, não tá muito interessado em achar as pessoas, não”.

Também revelaram a sabedoria de dona Aparecida, que perdeu amigos e bradou contra a mineradora: “Já deu esse negócio de Vale, né? Eles podem sair daqui, parar de querer ganhar dinheiro destruindo o meio ambiente. Dinheiro não é tudo. O que vale é o amor e a paz no coração”.

E ontem publicaram o depoimento carinhoso do sargento Leonardo sobre o cachorro Thor, de cinco anos, que tem trabalhado muito os bombeiros no encontro e resgate das vítimas. Ele é especialista nisso, na verdade. “Agora ele vai descansar, tomar um suplemento vitamínico que os médicos veterinários vão passar pra ele e amanhã volta a trabalhar. Eu já perdi a conta de quantas pessoas ele achou. Infelizmente, poucas vivas. Esse cão aqui já foi para varias missões comigo. Já esteve em Mariana, Herculano, Sardoá…”.  Coisa mais linda, veja no final do post.

E, se ainda não segue o perfil do SP Invisível, que tal fazer isso agora? É muito inspirador, todos os dias, onde quer que eles estejam. Além do Instagram e do Facebook, o SP Invisível também está no Twitter e no You Tube.

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Brumadinho chora – e se ajuda
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Fotos: Reprodução Instagram

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Mônica Nunes

Jornalista com experiência em revistas e internet, escreveu sobre moda, luxo, saúde, educação financeira e sustentabilidade. Trabalhou durante 14 anos na Editora Abril. Foi editora na revista Claudia, no site feminino Paralela, e colaborou com Você S.A. e Capricho. Por oito anos, dirigiu o premiado site Planeta Sustentável, da mesma editora, considerado pela United Nations Foundation como o maior portal no tema. Integrou a Rede de Mulheres Líderes em Sustentabilidade e, em 2015, participou da conferência TEDxSãoPaulo.