Brincar livre na natureza é o melhor remédio

crianças brincando na natureza
Tenho a impressão de que, hoje, as crianças nascem com um sentido de liberdade muito forte e expressam suas percepções e necessidades com muito mais clareza do que quando eu era criança. É assim que vejo a questão do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).

É possível – precisamos de mais pesquisas a esse respeito, claro! – que as crianças que são diagnosticadas como portadoras desse transtorno estejam expressando que não querem passar quase a totalidade do seu dia em ambientes fechados e assistidos, que não suportam essa falta de liberdade para correr, inventar seus próprios brinquedos e não ter tempo livre. E de ter que aprender os conteúdos escolares no momento da vida definido por adultos que não consideram a singularidade de cada uma delas.

As crianças que não se enquadram em projetos educacionais pré-definidos são medicadas por seu comportamento não ser considerado adequado. E, para lidar com isso, prescreve-se psicotrópicos, que deixam as crianças “bem comportadas”, apáticas e ausentes. O mais grave disso tudo é que a medicalização com o metilfenidato, componente da Ritalina e do Concerta, principal psicotrópico receitado, tem sido abusiva.

Artigo publicado no jornal Folha de São Paulo, em 21/10/15, revela que o uso deste medicamento cresceu num índice muito maior do que o dos diagnósticos de TDAH no Brasil. O mesmo texto comenta que o diagnóstico dessa enfermidade não tem sido feito de forma criteriosa, muitas vezes vindo da própria escola, sem análise de um médico.

Se, de um lado, o diagnóstico e a prescrição do medicamento devem ser mais rigorosos, de outro, quando o primeiro é bem feito, os médicos não conhecem outra forma de tratamento que não seja a administração deste psicotrópico.

O jornalista Richard Louvcitado no Conexão Planeta e do qual falaremos muito neste blog, dada a amplitude do seu trabalho – inclui o TDAH como parte das enfermidades da Síndrome de Déficit de Natureza.

Já consultei diversas publicações científicas divulgadas no site da Children & Nature Network, movimento por ele criado, apontando o “brincar livre” com a natureza como o “medicamento” ideal para prevenir e, em muitos casos, para curar a TDAH. Artigo publicado pela Universidade de Copenhagen, analisa o quanto as crianças portadoras do TDAH podem se beneficiar com essas brincadeiras ao ar livre e junto à natureza. Esse novo campo de pesquisa, que está se formando nesta universidade, visa comparar os benefícios dessa atividade e os dos medicamentos nos pacientes diagnosticados com TDAH. De acordo com esse texto, o que já se pode afirmar é que o contato com a natureza propicia melhor saúde mental para as crianças.

Em minha experiência – não só no projeto Ser Criança é Natural (realizado com Ana Carol Thomé, com quem divido este blog), mas também em outros projetos com crianças maiores e com adultos -, posso afirmar que a natureza ajuda a concentrar a atenção e a ampliar a acuidade de cada um de nossos sentidos: com a atenção concentrada se ouve melhor, se vê com mais detalhe, se sente mais a temperatura e a umidade, se percebe com mais detalhes todas as nuances do ambiente e suas mudanças, o tempo todo.

Resta-nos o desafio de conseguir oferecer esse tempo/espaço para nossas crianças. Se pais e educadores entenderem a importância da natureza em nossas vidas, conseguiremos pouco a pouco flexibilizar as agendas das crianças criando momentos ricos de aprendizagem com o mundo natural.

O presidente dos Estados Unidos, Barak Obama, reconheceu essa importância recentemente, criando o projeto Every Kid in a Park, que garante entrada gratuita para as crianças nos parques nacionais do país. Pais e educadores precisam ser estimulados a rever seus planejamentos e incluir preciosos momentos com a natureza na rotina dos pequenos.

Vamos ver o que conseguiremos construir aqui no Brasil: divulgar informações sobre o tema, traduzir publicações, incentivar pesquisas, oferecer oportunidades para que a natureza seja considerada de verdade um direito da infância. No que depender de nós do movimento Ser Criança é Naturale do Conexão Planeta – será maravilhoso.

Fotos: Renata Stort

5 comentários em “Brincar livre na natureza é o melhor remédio

  • 21 de janeiro de 2016 em 6:06 PM
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    Texto excelente!! A ideia de administrar psicotrópicos para crianças é um tanto perturbadora.

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  • 2 de maio de 2016 em 5:13 PM
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    No que depender do meu blog Segredos Maternos, o movimento “Criança na Natureza” também sempre será incentivado!

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  • 2 de outubro de 2017 em 3:49 PM
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    Excelente texto! Enquanto não nos voltarmos à nossa essência (e isso inclui a mãe natureza), será difícil de imaginar uma vida livre no sentido pleno!
    Através do blog http://www.crescendonanatureza.com.br compartilhamos nossas experiências com outros pais e tentamos incentivá-los a instigar em seus filhos o prazer pela descoberta que o meio ambiente nos traz!
    Parabéns pelo movimento!

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Rita Mendonça

Bióloga e socióloga, é autora dos livros “Como Cuidar da Natureza” e “Conservar e Criar”, sócia-diretora do Instituto Romã. Ministra cursos, vivências e palestras para aproximar as pessoas do ambiente natural. Acredita que a criança é a natureza se tornando humana e, por isso, precisa conviver com ela para seu desenvolvimento sadio e integral.