Bolsonaro anuncia apoio à reabertura da estrada que corta o Parque Nacional do Iguaçu

Bolsonaro anuncia apoio à reabertura da estrada que cortará ao meio o Parque Nacional do Iguaçu

A chamada Estrada do Colono é um assunto antigo, polêmico e desagradável aos paranaenses que lutam pela conservação ambiental.

A rodovia, de cerca de 18 quilômetros, foi fechada em 2001 por ordem da Justiça Federal por “ameaçar a integridade do Parque Nacional do Iguaçu, no oeste do Paraná, e a segurança nacional pela proximidade com a tríplice fronteira”. Na época, a estrada era usada como rota de contrabando entre Brasil, Paraguai e Argentina.

O parque, uma Unidade de Conservação (UC), é o maior remanescente de Floresta Atlântica da região sul do Brasil. Segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pela gestão do parque, ele protege uma riquíssima biodiversidade, constituída por espécies representativas da fauna e flora brasileiras, das quais algumas ameaçadas de extinção, como a onça-pintada, o puma, o jacaré-de-papo-amarelo, o papagaio-de-peito-roxo e árvores como a peroba-rosa e a araucária.

O parque é Patrimônio Natural da Humanidade

Por ano, cerca de 1,6 milhão de pessoas visitam o Parque Nacional do Iguaçu, que tem como principal atração, as Cataratas do Iguaçu. Com uma administração focada na sustentabilidade, conseguiu-se nas últimas décadas, mesmo com o aumento de turistas, diminuir os impactos na vida selvagem.

Todavia, mais uma vez, a famigerada Estrada do Colono vem colocar uma ameaça sobre esse Patrimônio Natural da Humanidade da Unesco, título recebido em 1986.

Uma ferida na floresta

Em 2013, um Projeto de Lei (PL) 7123/2010, já havia sido discutido na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, com a intenção de criar uma ‘estrada-parque’. Na época, houve uma grande pressão da sociedade civil. Quase mil entidades não governamentais enviaram alerta à Unesco e à União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN, em inglês) sobre a questão.

O problema é que agora, a intenção de reabrir a Estrada do Colono ganhou o apoio presidencial. Em visita ao Paraná, recentemente, Jair Bolsonaro declarou que por ele, o projeto vai em frente. “Da nossa parte já conversamos com o ministro (do Meio Ambiente) Ricardo Salles e tem também a questão da licença estadual que parece estar bem adiantada lá com o governador Ratinho Junior. Então, se Deus quiser, brevemente teremos essa estrada aberta”, afirmou.

O autor da proposta mais recente é o deputado Nelsi Coguetto (PSD). O texto já foi aprovado pela comissão de Viação e Transportes da Câmara e aguarda análise da Comissão de Meio Ambiente. Se receber o ‘ok’, vai direto ao Senado, sem a necessidade de apreciação em plenário.

“É mais uma tentativa de reabrir uma estrada destrutiva dentro do Parque Nacional do Iguaçu”, critica Angela Kuczach, diretora executiva da Rede Nacional Pró-Unidades de Conservação, organização não governamental que trabalha, em conjunto com outras entidades e pessoas, com a missão de proteger, fortalecer e ampliar o conjunto das Unidades de Conservação da Natureza no Brasil, especialmente as de Proteção Integral.

“Essa ‘picada’, que um dia virou uma estrada ilegal, está sendo usada novamente dentro uma artimanha de um projeto para rasgar a floresta. De tempos em tempos, esse assunto vem à tona”, diz.

Angela destaca, que após 20 anos do fechamento da Estrada do Colono, hoje o Parque do Iguaçu tem um serviço de concessões muito bem estabelecido, que gera milhares de empregos em Foz do Iguaçu e nos municípios do entorno (as prefeituras desses últimos recebem ainda ICMS ecológico por estarem localizadas na região do parque).

Interesses eleitorais

A quem interessaria a reabertura da estrada?

“Apenas aos políticos da área, que utilizam isso em suas campanhas eleitorais. Mas em nenhum momento, eles deixam claro para a população que os municípios só vão perder dinheiro”, afirma a diretora da Rede Pró-UC.

O conceito de ‘estrada-parque’, originário dos Estados Unidos, estaria sendo distorcido no projeto de lei. Essas rodovias teriam como objetivo principal estimular o turismo, para que as pessoas apreciem a paisagem, através de mirantes, pontos de parada e outros atrativos, o que não está incluso no plano atual.

Se aprovado, o PL abriria uma “ferida  no meio do parque”, alerta Angela. E isso poderia ameaçar o título de Patrimônio da Humanidade e e impactar seriamente o turismo. Além disso, pode propiciar a presença de caçadores e contrabandistas no local. “Irá fragilizar a sobrevivência da vida selvagem. É abrir a porta para os bandidos entrarem”, ressalta Angela.

Na década de 90, a população de onças-pintadas foi praticamente extinta no Iguaçu. Considerada criticamente ameaçada de extinção, a espécie conseguiu se recuperar no parque, graças a esforços de conservação. O último censo realizado, em 2017, revelou que o número de animais cresceu 70%, entre 2010 e 2016, conforme mostramos aqui.

Vida selvagem no parque pode sofrer com
a reabertura da Estrada do Colono

O impacto sobre a biodiversidade pode ser enorme. A estrada cruzaria o rio Floriano, que tem sua nascente dentro do parque, e é considerado o “mais puro” do Paraná. Os animais correriam o risco de atropelamento.

“A gente não pode cair nessa falácia de, por um termo que está sendo distorcido – estrada parque não é isso -, acreditar que será bom para o parque. Será péssimo!”.

Borboletas à margem do Rio Floriano

Fotos: Zig Koch/MTUR/Creative Commons/Flickr

3 comentários em “Bolsonaro anuncia apoio à reabertura da estrada que corta o Parque Nacional do Iguaçu

  • 30 de maio de 2019 em 12:06 PM
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    Esforço-me para crer que, noventa por cento dos governantes e líderes mundiais, prejudicam o Meio Ambiente por absoluta falta de efetivas, idôneas e objetivas informações sobre os males que causam a si mesmos e às gerações futuras de seus filhos e netos. Em sã consciência ninguém daria um tiro no próprio pé, ainda que sob o pretexto de testar a arma. Por isso, continuo acreditando que, não por acaso, as Leis Universais delegam poderes para determinadas pessoas importantes salvarem o mundo onde respiram, não para destruí-lo (problema delas, se o fizerem). Preciso enxergar nelas o melhor delas, porque somos da mesma espécie humana e impossível conceber que anônimos ou famosos, a não ser estejam loucos, ateiem fogo na Terra, o berço de seus filhos, que despejem veneno nos aquíferos que os irão dessedentar e intoxiquem as sementes capazes de gerar flores e frutos que os irão embelezar e nutrir. Esforço-me para não descrer que Deus é brasileiro, mas é também o Criador de todas as galáxias, sem partido político e avesso a convenções humanas, transitórias e falíveis, impermanentes e finitas. Onisciente tudo sabe, Onipotente tudo pode e Onipresente está presente em todos mas, principalmente, acima de tudo.

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  • 30 de maio de 2019 em 10:21 PM
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    Infelizmente, é mais uma notícia que visa atingir uma unidade de conservação.Nas últimas semanas a imprensa noticiou que o presidente da república defendia abertamente a extinção da Estação Ecológica de Tamoios (RJ) para no seu lugar criar a “Cancun Brasileira”, independente da sua importância para a preservação de espécies raras. E o que não dizer do seu ministro do meio ambiente, candidato derrotado nas urnas que se vale do cargo para promover o desmonte de conselhos e orgãos de proteção.

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  • 15 de julho de 2019 em 9:24 AM
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    Infelizmente a hipocrisia humana é maior que qualquer coisa!
    Queremos um país de primeiro mundo, mas não queremos nem leis, nem concessões que um país de primeiro mundo precisa!!!
    O Impacto global no ecossistema desta e de outras estradas é nulo! Podemos disser sim que existe um impacto local, mas nada além disso.

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Suzana Camargo

Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.