“Às vezes o cara pega o canudinho, tem uma baleia lá e ele põe na boca dela”, diz presidente da Fiesp


“Às vezes o cara pega o canudinho, tem uma baleia lá e ele põe na boca dela”, diz presidente da Fiesp, em entrevista sobre plástico

Parece piada da mau gosto. Ou melhor, de péssimo gosto. Como alguém tem coragem de dizer tamanha asneira em uma entrevista?

Pois José Ricardo Roriz Coelho, presidente em exercício da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast) foi o autor da frase que aparece no título deste post. Ele concedeu uma entrevista à jornalista Taís Hirata, do jornal Folha de S. Paulo, sobre o mercado do plástico.

Para Coelho, há muitas notícias falsas e falta de embasamento científico sobre o impacto do plástico ao meio ambiente. Talvez ele não tenha lido estudos feitos, por exemplo, pela Universidade de Berna, que revelou que foram encontradas 53 toneladas de micropartículas plásticas depositadas em áreas de várzeas de rios de reservas naturais da Suíça. Ou então, o vídeo da Agência Espacial dos Estados Unidos, a NASA, que mostra, em imagens, as ilhas de lixo plástico espalhadas pelo planeta.

Quem sabe o presidente da Fiesp também não costuma ler muito notícias internacionais de sites e revistas e ainda não percebeu que há um movimento global que tem como principal objetivo reduzir o uso de plástico porque sim, ele causa um impacto gravíssimo nos oceanos e na vida marinha.
O Rio de Janeiro foi a primeira cidade brasileira a banir canudos plásticos, seguindo uma tendência mundial e na esteira de outras grandes metrópoles e países como VancouverNova York e Inglaterra.

O presidente da Abiplast também não deve ser muito assíduo na leitura das colunas empresariais, porque já teria visto que cadeias multinacionais como McDonalds e Starbucks anunciaram recentemente que os canudos plásticos serão substituídos pelos de papel. Por que será mesmo?!

Mas voltando à entrevista da Folha de S. Paulo, José Ricardo Coelho afirmou ainda que “os canudinhos plásticos e outros descartáveis representam uma parcela mínima do consumo total do material (lixo do planeta)”.

Mesmo se ele estivesse com a razão, e o plástico representasse uma parcela mínima, como diz, esta quantidade já provoca um estrago enorme em nossos mares. Há alguns meses, uma baleia cachalote foi achada morta na Espanha com 29 kg de plástico no estômago e no começo de junho, outra
na Tailândia tinha engolido 80 sacolas plásticas.

E é neste ponto da entrevista que Coelho solta a pérola: “Esse barulho todo é canudinho e copo, que não dá 2%. Às vezes o cara pega o negócio de canudinho, tem uma baleia lá, põe os canudinhos na boca dela”.

Difícil fazer algum comentário sobre a afirmação acima. Imagino que ele tenha se arrependido muito de ter dito esta frase.

Segundo o atual presidente da Fiesp e da Abiplast, “Plástico é hidrogênio e carbono. O stent, a prótese, tudo é feito de plástico, isso não faz mal nenhum ao ser humano”.

Ele alega, entretanto, que a indústria tem buscado alternativas mais sustentáveis, como embalagens mais finas, com menos matéria-prima.

Difícil acreditar que a indústria brasileira do plástico, tendo à frente alguém que diz que “alguém põe um canudinho na boca da baleia” fará muito esforço e trará inovação sustentável para o setor.

“Alguém põe um canudinho na boca da baleia” é a pérola do presidente da Fiesp

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Foto: Gregory “Slobirdr” Smith/Creative Commons/Flickr e Valter Campanato/Agência Brasil

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Suzana Camargo

Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.