A árvore morta cheia de vida

arvore morta cheia de vida

Nos cursos e oficinas de fotografia que ministro, um dos meus conselhos é o famoso “não deixe para amanhã o que você pode fazer hoje”. Já perdi boas fotos no passado pelo fato da situação ser “fácil demais”, algo que eu não precisaria colocar como prioridade, com a certeza de que nos dias seguintes a cena continuaria lá ao meu dispor. Apesar de algumas oportunidades perdidas, em pelo menos uma ocasião eu consegui agir mais rápido do que a natureza.

Tem uma árvore perto de casa que sempre me fascinou por sua beleza e imponência. Reina soberana em meio ao capim que a rodeia, com seus galhos caprichosamente retorcidos em um padrão visualmente agradável – e eu vivia imaginando o dia em que conseguiria uma foto que fizesse justiça à toda sua grandiosidade.

Tal momento chegou em um final de tarde de março, quando ao longe formou-se uma tempestade que acabou se dissipando, deixando para trás um rastro de espetaculares nuvens com tons de vermelho e laranja contra o restinho de azul do céu. Saí com a câmera e fiz algumas fotos aproveitando os últimos instantes destas cores, que logo ficaram desbotadas com o cair da noite.

Algumas semanas depois, a surpresa: outra tempestade acertou em cheio a região e um relâmpago poderoso deve ter atingido a querida árvore, fritando sua copa e quase partindo-a ao meio. Lá se foi minha árvore predileta, mas não sem antes me propiciar a chance de eternizar sua beleza em uma fotografia dias antes.

Mas quem disse que era seu fim? No final do ano passado, quase quatro anos após o ocorrido, descobri que um casal de falcões-morcegueiros havia escolhido seu tronco para fazer o ninho e criar o filhote que aparece na imagem abaixo. “Minha árvore” pode ter morrido, mas até hoje abriga muitas formas de vida que, assim como eu, devem ter algum motivo especial para gostar tanto dela.

falcão e seu filhote no tronco da árvore

Fotos: Daniel De Granville

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Daniel De Granville

Biólogo com pós-graduação em Jornalismo Científico, começou a carreira fotográfica na década de 90, quando vivia no Pantanal e trabalhava como guia para fotógrafos renomados de várias partes do mundo, o que estimulou seu interesse pela atividade. Já apresentou exposições, palestras e cursos na Alemanha, EUA, Argentina e diversas regiões do Brasil. Em 2015 foi o vencedor do I Concurso de Fotografia de Natureza do Brasil, da AFNATURA, e em 2021 ganhou o primeiro prêmio na categoria “Paisagem” do Concurso Global da The Nature Conservancy. Vive atualmente em Florianópolis, onde tem se dedicado ao ensino de fotografia e continua operando expedições em busca de vida selvagem Brasil afora