Artistas retratam sofrimento de animais na campanha e exposição “Sinta na Pele”


*Atualizado em 18/08/22
Após três anos de seu lançamento, a exposição “Sinta na Pele” está em cartaz novamente, até o dia 8 de setembro, no Shopping Metrópole em São Bernardo do Campo.
Segue abaixo o texto original da reportagem:

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Acorrentados. Violentados. Confinados. Traficados. Depenados. Abandonados. Engaiolados. Humanizados. Escalpelados. Torturados. Encarcerados. Explorados. Caçados.

É assim, que ao longo dos últimos séculos, o ser humano tem tratado os animais.

Agora, através de um ensaio fotográfico belíssimo e chocante, a campanha Sinta na Pele mostra que não podemos mais permitir que milhões de animais, todos os dias, sejam torturados e mal tratados.

“É nossa obrigação parar para refletir, despertar e mudar nossa maneira de viver e ver os animais. Vamos sentir na pele o que os animais sentem”, diz a Ampara Silvestre, organização idealizadora da campanha.

Lea T, Thaila Ayala, Bruno Gagliasso, Giovanna Ewbank, Laura Neiva, João Vicente de Castro, Fê Paes Leme, Fernanda Tavares, Luan Santana, Romulo Arantes Neto, Ellen Jabour, José Loreto e Fiorella Mattheis são os artistas que participaram do ensaio, feito pelo fotógrafo Jacques Dequeker.

São imagens fortes e reais. Muito reais. Conseguem passar toda a aflição e a dor que nós – seres humanos – infligimos aos animais. O texto de divulgação da campanha nas redes sociais diz tudo:

“Ao longo do tempo, o homem se revelou o mais irracional dos animais. Sua indiferença já maltratou e matou bilhões de seres indefesos.

A ganância desenfreada levou à extinção formas de vida insubstituíveis e devastou brutalmente seus biomas. a cada dia, 150 espécies são exterminadas do planeta devido à interferência humana.

O sofrimento, muitas vezes silencioso, é um grito de socorro desses que não têm voz para se defender.

Precisamos evoluir nosso jeito de nos relacionarmos com a natureza. Evoluir e romper este silêncio.

A conivência incentiva o crime. O poder de mudança está em nossas mãos.

A exploração a que submetemos os animais não-humanos não pode mais ser tolerada.

Tenha empatia. Reflita. Não se cale. Transforme.

Sinta na pele!”

Para que a campanha atinja o maior número possível de pessoas, ela foi transformada também em exposição. Até 13 de setembro o, os treze painéis estarão no Faria Lima Financial Center, em São Paulo. A mostra é gratuita e aberta ao público*.

Junto com cada foto, há um texto, tão chocante quanto a imagem.

Artistas retratam sofrimento de animais na campanha e exposição “Sinta na Pele”

Confinados

Para quem vê de fora, isso é só um grande objeto de decoração em que a vida aquática fica indo e vindo. O que não sabem é que não estou desfilando, mas procurando a saída. Alguns de nós se escondem nas pedras ou nos corais, buscando proteção contra as luzes artificiais. Imaginem só, eu poderia ter todo o oceano, ou mesmo um rio, para desbravar, mas fui confinado aqui, nessa caixa de vidro. Tentam reproduzir minha casa usando artifícios, mas ela é única. Ficar aqui nos mata aos poucos. Minha hora também vai chegar. E aí, tudo o que farão é me tirar daqui com uma rede, me jogar na privada, dar descarga e me trocar por outro. Minha vida não vale nada.

Artistas retratam sofrimento de animais na campanha e exposição “Sinta na Pele”

Engaiolados

Privaram-me da liberdade, tiraram-me o chão, roubaram-me o céu. Não sei qual foi o crime que cometi. Não importa se prenderam minha mãe e “legalmente” me fizeram nascer condenado à prisão perpétua ou se em algum momento fui capturado e engaiolado. ESTOU PRESO. Não tive direito a julgamento, nem a advogado. A cela é pequena e não consigo voar. Só recebo visitas de meu carcereiro, que tem um riso cínico e fala coisas que eu nunca entendo. Depois, novamente me deixa solitário, ilhado em mim mesmo, deprimido e estressado. Acham que meu canto é de alegria, mas é puro lamento. Tristeza pela imensidão da natureza que me foi tirada para satisfazer a vontade humana.

Artistas retratam sofrimento de animais na campanha e exposição “Sinta na Pele”

Explorados

Foi tudo tão rápido que mal deu tempo de desmamar. Nasci, fiquei com minha mãe por alguns dias, fui arrancado dela e, quando vi, estava em uma vitrine. Minha mãe é escravizada. É uma fábrica de filhotes e ninguém se importa com ela. Cachorros como eu, da raça da moda, valem muito. Mas preciso ser vendido rápido, pois quando fico “velho” perco o valor. Posso custar milhares de reais, parcelados no cartão de crédito, ou ainda pior, estar em oferta na Internet. Sou negociado como um objeto. Posso até ter garantia, mas meu destino é incerto. Enquanto isso, milhares da minha espécie apodrecem nos abrigos esperando por uma chance. Um dia o ser humano vai aprender que a estética é o que menos importa, e então o amor irá prevalecer.

Artistas retratam sofrimento de animais na campanha e exposição “Sinta na Pele”

Depenados

O lado triste do carnaval ninguém quer ver. Aves como eu são depenadas vivas e têm sua plumagem roubada para virar adereço. Muita gente acha que aquilo que desfila na avenida são fantasias artificiais, quando, na verdade, são naturais. Sobrenatural é a dor e o sofrimento que escondem. Algumas espécies são exploradas continuamente, ano após ano, e, em vez da morte, recebem a escravidão ad eternum. Se para os humanos Carnaval é festa, alegria e euforia, para mim é um grande pesadelo. Essa indústria da tortura também nos depena para enxovais que são recheados de crueldade. Como alguém pode pôr a cabeça no travesseiro e dormir tranquilo sabendo que para o seu repouso foi preciso tanto sofrimento e tortura?


Artistas retratam sofrimento de animais na campanha e exposição “Sinta na Pele”

Caçados

Sob a mira de uma arma eu sinto medo, desespero e fico totalmente vulnerável. É uma disputa desleal e covarde. Muitas vezes erram o alvo, me machucam e eu consigo fugir agonizando. Em outras, chego a morrer, mas acabo deixando meu filhote para trás. Ele também acabará condenado. Como um ser racional, dotado de inteligência, pode sentir prazer em ver outra criatura ser alvejada e sangrar até a morte? Como alguém pode fazer desta crueldade um esporte? Onde existe assassinato não pode haver diversão. A espécie humana evoluiu e não pode mais admitir que essa brutalidade seja legalizada. Todos contra a caça!


Escalpelados

Vim ao mundo em um filme de terror. Produzido e criado para ter minha pele arrancada covardemente em nome de uma indústria de luxo cruel. Mantido em gaiolas minúsculas, fiquei neurótico e me mutilei ao sentir o cheiro de sangue de tantos outros assassinados antes de mim. Estava só esperando a minha hora de ser eletrocutado ou esfolado ainda vivo. As madames não se importam, usam minha pele para tentar camuflar sua alma feia. Não se importam com a dor que senti e com o tempo em que agonizei até morrer. Só querem desfilar sua futilidade e superficialidade. Até quando, em nome da vaidade, os humanos ostentarão a morte de seres inocentes?

Torturados

Dizem que a indústria cosmética oferece muitos artifícios, mas ela não tem o direito de embelezar alguém com base na tortura e na crueldade contra animais como eu. As pessoas ficam desesperadas por produtos que as façam parecer mais jovens e mais belas. Mas e se soubesse que esses produtos foram testados em mim? Já pararam para refletir sobre o que são esses testes, como eles são conduzidos ou a dor que causam em nosso corpo e alma? Os testes não são mais necessários. Não é mais preciso causar tanto sofrimento. Se servimos de cobaia e recebemos produtos químicos para avaliar irritação e corrosão da pele, irritação ocular e toxicidade aguda, a responsabilidade é sua. A escolha está em suas mãos. Sua vaidade vale mais que nossas vidas? A tortura de seres inocentes não te traz desconforto ou sofrimento? Porque eu, agonizo nesse suplício.

Traficados

As razões pelas quais os humanos me querem são muitas. Admiram minha beleza, acham que sou diferente, exótico, “cool” ou que trago “status”. Mas eu me pergunto: com que direito me domesticaram? Eu quero estar em meu habitat, não dentro da sua casa. Quero exercer meu papel biológico, não virar um bibelô para te satisfazer. Você pode justificar dizendo que sua compra é legalizada, mas o que não sabe é que grande parte dos criadores contribuem para o tráfico. Não há como assegurar que eu ou minha mãe não fomos capturados da natureza. Os humanos não querem saber que, a cada dez de nós, nove acabam morrendo na captura ou durante o transporte. Que o tráfico de animais silvestres é o terceiro maior do mundo. Então, se você me admira, deixe-me em paz, na natureza. Aprenda a me observar na natureza, sem me tocar e confinar.

Violentados

Não quero brigar, mas me treinaram para ficar assim, feroz e alucinado. Querem me ver machucando e matando. Para isso, fui estimulado desde pequeno a ferir incansavelmente. Quem me deixou agressivo foi o homem, que, apesar de civilizado, acaba se revelando o maior dos monstros. Aqueles que gostam de nos ver brigando, participam desse tipo de violência e ainda apostam em quem será o vencedor não podem ser considerados seres humanos “normais”. Certamente possuem alguma psicopatia, por se divertirem com tamanha barbárie. Mesmo isso tudo sendo uma prática ilegal e absurda, ainda acontece em vários lugares do Brasil. E como sempre pode ser pior, existem políticos que querem regulamentar tal “esporte”. Na verdade, esse primitivismo é crime e deve ser combatido.

Abandonados

Quando me puseram no carro achei que fosse para passear, mas fomos ficando cada vez mais longe de casa, dos parques e das minhas praças favoritas. Pensei então que fosse alguma brincadeira nova. Eu adoro brincar e meus pais sabem disso. Foi aí que eles pararam em um lugar estranho e me colocaram para fora do carro. Foram se afastando e, nesse jogo de pega-pega, tentei alcançá-los para mostrar que sou um bom companheiro. Comecei a ficar exausto, confuso, desorientado e sem forças. Será que ficaram tristes porque comi o sapato da mamãe ou porque roí o sofá? Ou porque fiz xixi no lugar errado? Ou porque fiquei velhinho e doente? Desculpem, papais, eu não fiz por mal. Estou com muito medo, sede e fome. Não me deixem aqui sozinho, vocês são tudo o que eu tenho.


Encarcerados

Um dia eu estava na natureza até que, por culpa da interferência humana, fui parar em uma cela. Fiquei agoniado, estressado e deprimido. Perdi minha identidade. O que eu fiz para merecer isso? O mais estranho é que muitas pessoas vêm me visitar, acham educativo me ver confinado e ficar examinando meu comportamento condicionado, estereotipado e triste. Não entendem nada. Não percebem que preciso viver em um meio ambiente protegido, e não nesse cárcere privado. O isolamento me enlouquece, sinto falta do cheiro do mato, da terra e da minha liberdade. Até quando inocentes vão pagar por crimes que não cometeram?

Humanizados

A plateia está lá para se divertir. Mesmo que eu seja humilhado, ridicularizado, adestrado, escravizado, condicionado ou dopado, eles pagam para me ver. Para mim, é um show de horrores, e isso não tem graça nenhuma. Quando chega a minha vez, entro em pânico: preciso fazer tudo certo. Não posso tremer e nem me comportar mal, senão levo uma boa surra. O público não pode sair decepcionado e minha performance deve ser impecável. Além disso, tenho de interagir com crianças, tirar selfie com adultos alienados e fingir que estou feliz. Só que por dentro existe a tristeza e o lamento de quem teve a natureza roubada. Que respeitável público é este que desrespeita tanto os animais?

*A exposição “Sinta na Pele” está aberta até a sexta-feira (13/09) . O Faria Lima Financial Center fica na Avenida Faria Lima, 3400, Itaim Bibi, em São Paulo. Por conter imagens fortes, a mostra não é recomendada para menores de 14 anos.

Fotos: divulgação Ampara Silvestre/Jacques Dequeker

5 comentários em “Artistas retratam sofrimento de animais na campanha e exposição “Sinta na Pele”

  • 9 de fevereiro de 2019 em 12:25 AM
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    “Belíssimo e Chocante”; perfeita a definição para a Campanha e Exposição ousadas mas absolutamente imprescindíveis para convencer pessoas desatualizadas e por fora do contexto de respeito à vida de todas as espécies. Um grito veemente de BASTA! contra o injustificável sofrimento infringido aos animais pela espécie humana egoísta e prepotente, pois o que certifica essa covardia é exatamente seu egoísmo e prepotência que, ao longo dos séculos, apenas mudou de indumentária, embalagem e rótulo sem transformar-se realmente na espécie racional e superior que já acha que é mas falta muito ainda. Parabéns a você, Suzana, pela coragem da publicação colocando-se na posição contrária aos desmandos humanos contra animais inocentes, porque barbárie e carnificina não correspondem a Planetas evoluídos, conectados com Deus. Impossível, também, não comparar a escravidão animal com a escravidão da raça negra, embora alguns considerem isso um desdouro humilhante e inadequado, aviltante até, porém não é. Dor é dor, prisão é prisão, tortura é tortura, exploração é exploração e morte é morte, não importando se experenciados por pessoas ou bichos, refletem a ignorância, covardia e vileza de quem os pratica quando subjuga outros seres, ignorando seus sagrados direitos, em nome da condição supostamente superior que pensa ter. Holocaustos e supremacias de raças e espécies são análogas quando extrapolam as limitações de intolerância e preconceito que, no momento atual do mundo, urge erradicar para sempre do Planeta, para que o Universo o considere apto a ser parte dele, conectado com Quem o criou. Quando grilhões se partem, estejam em braços ou patas, Alforrias e Leis Áureas se cumprem fragorosamente, expondo a nudez espiritual daqueles que os mantiveram escravos, indiferentes aos clamores da própria consciência e eles se perdem nos refolhos da História, varridos como o nada que são. Ninguém está habilitado a escravizar ninguém, nem torturar, explorar ou degradar outros seres, desrespeitando-lhes os direitos de viver porém os séculos descrevem perfeitamente como humanos praticaram tais aberrações acobertados pela Lei, muitas vezes. Já chega. É preciso refletir sobre de que lado estamos HOJE, porque proibido ficar “em cima do muro”, hasteando a bandeira da Proteção aos Animais, almoçando eles. “Sobre Quem Somos”, afinal, é preciso decidir; quais os “parceiros” que escolhemos para lutar com eles, seja com palavras ou ao vivo e à cores, para descobrir, sem rasuras, qual o “contato” imprescindível com a Divindade que precisamos manter para sermos distinguidos na condição de Seus filhos ou adversários. Se ainda derramamos o sangue dos animais, se eles fogem de nós porque nos enxergam como os predadores cruéis que temos sido, não somos Anjos. Nem ao menos irmãos ou amigos deles.

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  • 9 de fevereiro de 2019 em 10:28 AM
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    Parabéns pela iniciativa de tão profunda campanha!!

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  • 10 de fevereiro de 2019 em 1:35 PM
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    A realidade é tão triste. Parabéns a campanha e todos envolvidos, real, triste e necessária. Um dia dia talvez possamos evoluir e sermos todos iguais.

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  • 11 de fevereiro de 2019 em 1:54 AM
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    Parabéns pelo trabalho, sempre fui muito sensível a tudo isso, espero que assim outras pessoas possam ser sensibilizadas. É duro sentir na pele mas as vezes é preciso ter esse raciocínio.

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  • 16 de fevereiro de 2019 em 11:25 PM
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    Ótimo trabalho, espero , de verdade, que o mundo mude.

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Suzana Camargo

Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.