A horta em tempos de crise

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Os Jogos Olímpiacos acabaram e nós brasileiros lavamos a alma ao ver o gol da redenção! A beleza das cerimônias de abertura e de encerramento evidenciaram a biodiversidade do país e o talento de nosso povo, em homenagem especial aos nossos artesãos.

Foi uma saudação ao otimismo, depois de tanta vergonha que passamos como nação, diante da corrupção. Ao ver os campeões e sua força inigualável da juventude, lembramos mesmo que, por pouco tempo, que muito depende de nós, muito pode ser feito com determinação, metas e cooperação.

Na natureza, como para os seres humanos, as crises estão incluídas na passagem do tempo e nas sucessivas estações do ano. O clima se encarrega de trazer o excesso de água ou a falta dela, noites de geada, tempestades, ventanias, enchentes. E em cada região do Brasil, é preciso lidar com a melhor solução e adaptação ao clima local.

Aqui onde eu moro e cultivo minha horta, no Planalto Central, a cidade que herdou o maior legado de Burle Marxseus bosques e jardins -, os ipês florescem trazendo aos insetos o último refúgio de néctar. Brasília vibra com cada florada, em maciços exuberantes de flores, espalhadas pela cidade, em copas de ipês, de todas as cores, e também de paineiras e flamboyants.

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Para os insetos, abelhas e colibris, a seca se instala de maio à outubro. A umidade do ar chega a ficar intolerável. As crianças são poupadas de fazer esportes nas escolas, dores de cabeça surgem por falta d’água e as gotas da chuva chegam ser tão passageiras, que algumas evaporam antes mesmo de chegar ao solo. Nessa época, as árvores guardam na seiva de seus troncos a última reserva das chuvas de outono.

Algumas chuvas, no entanto, passam com duração de algumas horas ou minutos no centro do país, enquanto nas demais regiões, pessoas comentam que sobre o frio, que chegou para ficar.

No Planalto Central, dizem os mais velhos que estas são as chuvas dos ipês, do caju, do pequi e nessa última semana, aprendi mais uma, a chuva da manga.

As árvores com suas longas raízes conseguem fazer suas reservas, mas na horta, acontece toda uma outra história. A cobertura de inverno à essa altura já se desfez (decomposta pela ação do sol inclemente). A terra seca vai aos poucos engolindo as plantas heroínas que resistiram, alfacinhas diminutas, tagetes e ervas aromaticas, com folhas queimadas de sol forte, esperam por dias melhores para lançarem suas sementes. Os pezinhos de  espinafre recentemente germinados, com chegada das noites frescas, esperam o retorno das águas de outubro, novembro e dezembro para estender seus ramos.

Porém, se voce vive nas regiões onde a intensidade das chuvas aumenta nesta época do ano e as temperaturas caem, formando queimaduras nas hortaliças, melando as verduras com podridão e excesso de umidade, só mesmo colocando plásticos para evitar o excesso de água. Pode-se tentar protegê-las com folhas de palmeiras para que não se queimem. Com as grandes amplitudes térmicas (extremos da temperatura no mesmo dia, ou seja, muito frio pela manhã e muito calor durante o dia, por exemplo), a crise se instala na horta por afogamento de plantas e a lixiviação do solo (lavagem).

Regar menos se faz necessário, cobrir os canteiros com plásticos e fazer a amontoa do solo junto às raízes das plantas recém-germinadas e garantir seu desenvolvimento é a melhor opção. Já na seca, a recomendação é plantar em sementeiras à semissombra e  irrigar diariamente para não colocar à perder todo o trabalho de adubação orgânica feito anteriormente.

Sem umidade e a cobertura morta, as minhocas e seus ovos acabam morrendo, assimo como a vasta rede de micro-organismos ativos que fermentam os compostos orgânicos, adubando o solo. Se não forem cobertos e protegidos do sol, com bastante palha e umedecidos duas vezes por dia, vão se queimando pela ação dos raios solares deixando a terra nua e estéril.

Esta é a melhor época do ano para limpar o mato, afofar o solo, melhorando sua estrutura e drenagem. É uma boa hora também para corrigir o solo e aplicar cinzas e minerais, como farinha de osso, farinha de peixe e até mesmo, magnésio, se suas camélias estiverem abortando as flores.

O momento é ideal ainda para semear raízes e flores para quando a temporada de chuva chegar. E que tal semear em sua horta cenouras, beterrabas, rabanetes, nabos e couves para que as flores possam atrair as borboletas, abelhas e colibris? Ou então, que tal bordar os canteiros com flores para receber os insetos na primavera?

Mas sobre borboletas, vamos conversar mais na semana que vem! Até lá!

P.S. Os Jogos Olímpicos acabaram, mas as Paralímpiadas vem aí! Vamos prestigiar?!

Fotos: domínio público/pixabay (abertura) e Francisco Araújo/Creative Commons/Flickr (ipê amarelo)

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Liliana Allodi

Geógrafa, paisagista, educadora ambiental e ilustradora científica. Começou a carreira em São Paulo como consultora paisagística. Durante 10 anos viveu no exterior (Austrália, Israel e USA) e neste último país, firmou suas habilidades para trabalhar com crianças. Atualmente dá aulas de horticultura para alunos do Ensino Fundamental, em Brasília. Também desenvolve projetos junto à Cia da Horta para centros de ensino, clubes e empresas.